Mostrando postagens com marcador Fantasia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Fantasia. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, dezembro 25, 2023

SAN - Detetive Folclórico - Uma emocionante jornada mística




Eles estão entre nós. Os seres mitológicos de nossa tradição oral. Saci, Curupira, Caipora, Boto... e a temível Cuca. E ela não está satisfeita. Irritada com a destruição da natureza, perpetrada por humanos, a bruxa reptiliana decide nada mais nada menos que aniquilar toda a humanidade. Ainda bem que temos Sandro, o detetive folclórico, para nos proteger e descobrir os planos da maligna cuca antes que seja tarde demais.

Assim tem início um dos livros mais divertidos que li. SAN - Detetive Folclórico, de Henrique Zimmerer, é uma narrativa leve e fluida, cheia de ação, humor e romance. Sandro - ou San, para os íntimos - é na verdade uma entidade folclórica e usará todo o seu poder para salvar a humanidade da extinção.

Como braço direito do detetive está o professor de biologia Custódio, outra entidade da nossa tradição oral brasileira. Custódio é ruivo, usa dreadlocks e tem o corpo coberto de tatuagens. É um exímio caçador e suas habilidades serão usadas para rastrear os inimigos que desejam tanto o fim da humanidade. 

E por fim, temos dois humanos: Alice e Daniel. Ela é uma jovem intempestiva e destemida. Dotada com um misterioso poder e a capacidade de ver o que os demais humanos não conseguem, a jovem entrará na luta para salvar os seres humanos, auxiliada pelo seu melhor amigo. Daniel perdeu o namorado André em um ataque realizado por espíritos de fogo, que destruíram uma boate em que Alice, André e Daniel estavam.

A narrativa se passa em Belo Horizonte. Sim, a capital mineira se torna o palco de uma luta épica entre entidades folclóricas, com alguns seres humanos dando força na batalha. A solução que o autor dá é genial. As pessoas comuns estão impedidas de ver fenômenos sobrenaturais. É como se elas não conseguissem prestar atenção nesses fenômenos. Com isso, as batalhas acontecem em plena luz do dia, com as mentes dos espectadores "adaptando" as partes espirituais de forma a poderem aceitar melhor o ocorrido. É uma solução interessante. E inclusive a narrativa sustenta que tudo o que acontece nos livros tem um "pezinho" na realidade. Ou seja, as narrativas de fantasia podem ter de fato acontecido.

Sandro, Custódio, Alice e Daniel são cativantes e possuem uma dinâmica própria. Sentem medo, insegurança, raiva e alegria. Suas reações são verossímeis e factíveis. Ainda que Sandro e Custódio sejam entidades mágicas, eles apresentam atributos tão humanos quanto você e eu.

Com cenas de ação de tirar o fôlego e um desenvolvimento de personagens cativante, SAN - Detetive Folclórico é uma jornada maravilhosa por um mundo que muitas vezes está escondido logo ali, para além do véu que encoberta nossos olhos.


Ficha Técnica

SAN - Detetive Folclórico

Zimmerer

ISBN: B09FZXVBDR

Ano: 2021 

Páginas: 209

Idioma: português

Editora: independente


Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/san-detetive-folclorico-12058021ed12043887.html

domingo, setembro 10, 2023

O Carvalho



Pense em um lugar mágico. Um lugar Encantado. Uma Floresta, cheia de animais, repleta de vida. Dentro dessa Floresta existe uma colina e no alto dela um Carvalho. Nas noites de luar, seres mágicos se reúnem ao pé do Carvalho e dançam, cantam. É possível dizer que o Carvalho parece balançar com o vento no ritmo das cantigas.

Mas o que poucos sabem é que há muitos e muitos séculos essa Floresta foi um deserto. Um lugar inóspito, que separava alguns reinos. Um desses reinos era ocupado por magos, sábios, que criaram uma poção mágica. Com apenas uma gota, essa poção era capaz de fazer brotar uma plantação, um pomar ou mesmo um lindo jardim.

Essa poção despertou a ganância de um impiedoso rei, que reuniu um enorme exército. Este rei atravessou o deserto, invadiu o reino dos magos, destruindo tudo o que tocava e roubando a poção. Afinal, quem a tivesse seria declarado o dono do mundo. 

O rei então retornou pelo mesmo caminho que viera. Quando seu exército estava cruzando o deserto, ele descobriu uma conspiração de seus generais, que queriam roubar a poção e matá-lo. Com apenas um cavalo e poucas provisões, o rei decidiu fugir, para salvar sua vida.

Dias depois, ele se viu sem saída. Seu cavalo estava morto e ele, faminto e andrajoso, estava sobre uma colina, ponderando sobre seus atos. Observou o deserto e ponderou de que havia adiantado tanta ganância se agora ele morreria sem alcançar suas ambições?

Ele então olhou para o frasco em suas mãos onde estava a poção e pensou que, ao bebê-la, conseguiria alguns dias de vida. Então destampou o frasco e bebeu toda a poção.

Sentiu uma nova energia a atravessar seu corpo. Achou que seria capaz de atravessar vários desertos. Mas ao dar o primeiro passo, não conseguiu se mexer. Estava preso ao chão. Seus pés e pernas eram raízes. Seus braços eram galhos. Seus cabelos, folhas. Não era mais um homem, era um Carvalho. 

E o Rei-Carvalho observou por todos os anos a poção fazer efeito também nos vales do deserto, onde inúmeras plantas cresceram e a vida retornou com energia. Nos primeiros anos, ele considerava tudo aquilo como uma punição pela sua loucura e ganância. Mas após séculos de vida naquela floresta encantada, após ser várias vezes surpreendido pela vida, ele passou a acreditar que na verdade havia recebido uma dádiva divina e imerecida, dada a um homem que nunca havia aprendido o que é ter os pés no chão. 

domingo, março 05, 2023

O Viajante Cinzento, nova obra da Editora Letramento, é uma fantasia medieval com mortos-vivos


Em meio a uma maldição de mortos-vivos, surge um homem sombrio. Vestido por um manto cinzento, este jovem, cujo nome é Seridath, tem como espada a poderosa Lorguth. Mas, num misto de poder e capricho, Lorguth resiste às vontades de seu portador. Ela é sanguinária e ambiciosa. Quer provar do sangue e de almas de grande poder.

Seridath, o Viajante Cinzento, descobre que o caminho para a glória não é fácil como antes lhe parecia. Ele deverá usar de toda a sua força de vontade para colocar Lorguth em seu lugar e alcançar a fama e a glória que tanto almeja. O Viajante Cinzento é uma obra de fantasia medieval, situado em um mundo mágico, com suas próprias regras e magia. Enquanto uma terrível maldição assombra o reino, Seridath se verá diante de um dilema: quem comanda quem? Será ele o mestre da espada ou apenas a sua marionete?

A publicação foi possível graças à seleção pelo programa "Temporada de Originais", da Editora Letramento, que tem como objetivo viabilizar os trabalhos de novos autores de forma acessível. A obra está disponível no site do Grupo Editorial Letramento (www.editoraletramento.com.br).


Sobre o autor:



Samuel Medina nasceu no Rio de Janeiro, Capital, em 1981. Graduado em Letras, trabalha como servidor público na Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte/MG. Publicou, aos onze anos, o livro A grande guerra, edição independente. Contribuiu em diversas antologias pela Andross Editora. É também autor de O Medalhão e a Adaga (Multifoco, 2013), Patos Selvagens (Baobá, 2014), A Cidade Suspensa (Senhor da Lenda, 2015), Uma visita inesperada (a mascote, 2020) e Aurora (Letramento, 2022). Mantém o blog www.oguardiaodehistorias.com.br.

Instagram: @neritosamedi

segunda-feira, fevereiro 06, 2023

A Última Batalha - O crepúsculo final de Nárnia



Tirian é o último rei de Nárnia, mas ainda não sabe. Seus pensamentos estão ocupados pelo rumor do aparecimento de Aslam. Tomado de êxtase por causa dessa boato, o rei suspira em uma de suas casas de caça, onde descansa. Em sua companhia está o unicórnio Precioso, fiel amigo e companheiro de incontáveis batalhas.

O que Tirian desconhece - além de ser o último rei de Nárnia, é claro - que os boatos da aparição de Aslam nasceram das maquinações de um macaco e de um burro coberto pela pele do leão. E por muito pouco, esse macaco - o Manhoso - vendeu Nárnia para os calormanos, os quais estão assassinando as árvores falantes do Ermo do Lampião. E que uma insidiosa invasão a Nárnia acontece naquele momento.

Assim tem início A Última Batalha, que é também a última das Crônicas de Nárnia. Um final que se mostra pateticamente maligno uma vez que a última batalha acontece em uma Nárnia que não mais existe.

Sem adiantar os acontecimentos mais marcantes e buscando não entregar o enredo, afirmo apenas que A última batalha está dividido em duas partes. Uma pateticamente triste e outra pateticamente alegre. Não acredito que a última compensa a outra. Afinal, Lewis abandona Nárnia em prol de uma aproximação ainda maior com a simbologia cristã do que os livros anteriores. Ainda mais próximo - se é que isso é possível - de O leão, a feiticeira e o guarda-roupa.

Portanto, creio que esta seja a resenha mais difícil e incompleta que já fiz na vida. Incompleta porque, para evitar revelações do enredo, vou falar mais da primeira parte do livro. E Lewis acaba me forçando a isso, uma vez que, para mim, o escritor trai sua própria literatura em prol da mensagem cristã.

Em primeiro, Lewis dá o protagonismo da cena a dois animais falantes, algo nunca antes feito nos livros de Nárnia. Em seguida, em comparação com O cavalo e seu menino, o livro tem como protagonista alguém do mundo mágico, e não crianças vindas de nosso mundo. As crianças estão no livro, já adianto, mas o foco narrativo e o protagonismo estão inicialmente em Tirian por quase toda a primeira parte. Altivo, forte e honrado, Tirian é um rapaz de 25 anos. Um soldado irrepreensível. Seu companheiro, Precioso, apenas vem endossar essa imagem do rei, sempre aprovando seus atos, devotando ao humano total adoração e sendo correspondido.

Outra personagem de destaque é Jill. Enviada a Nárnia em companhia de Eustáquio, a menina é mais madura e preparada que o amigo. Ele, por sua vez, surge indeciso e temeroso. Não que o menino não pudesse ter medo, mas ela age como alguém como alguém que sabe lidar melhor com as próprias emoções. A menina se mostra uma excelente rastreadora, tendo frieza o suficiente para tomar decisões importantes antes e também durante a batalha.

Por falar em batalha, esse é o ponto forte da narrativa. Lewis faz o contrário que fez em Príncipe Caspian e narra uma refrega próxima e real, com mortes perto demais, deixando claro que a guerra não é coisa para crianças.

Sobre a segunda parte do livro, depois da fatídica batalha, pouco tenho a dizer. Lewis continua como exímio contador de histórias. Há certo tom melancólico e anticlimático nessa segunda parte, mas talvez isso advenha de uma leitura mais pessoal.

Como todos os demais livros, A Última Batalha vale a pena ser lido. Um livro gostoso de se ler e cheio de reviravoltas. Bem, pelo menos na primeira parte. Quanto ao fim de Nárnia, bem, por mim ela teria vivido - e ainda vive dentro de mim - para sempre!  


Ficha Técnica

A Última Batalha

As Crônicas de Nárnia # 7

C. S. Lewis

ISBN-13: 9788533616202

ISBN-10: 8533616201

Ano: 1997 

Páginas: 213

Idioma: português

Editora: Martins Fontes


Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/a-ultima-batalha-1106ed1479.html

domingo, fevereiro 05, 2023

Aprovada a capa do livro "O Viajante Cinzento"

 Sim, meus caros! O Viajante Cinzento agora será livro! O manuscrito foi aceito pela editora Letramento a partir da Temporada de Originais, que é um projeto que visa tornar acessível a publicação das obras de autores independentes.

Segue abaixo a versão aprovada da capa do livro:



Aguardem novidades sobre esse lançamento!

segunda-feira, janeiro 09, 2023

A Cadeira de Prata - A jornada e os sinais



Jill está desolada. Ela frequenta uma escola experimental onde as coisas não são fáceis. Seus colegas de escola, muitos deles, são terríveis e a perseguem. Foi por isso que Eustáquio a encontrou chorando em um canto do colégio.

Aquele é o mesmo Eustáquio Mísero, primo de Lúcia e Edmundo, Susana e Pedro. A jornada a Nárnia o transformou e agora ele é um bom sujeito. Ao encontrar a colega chorando, ele propõe que ambos peçam a Aslam que os levem a Nárnia.

O pedido funciona até bem demais e as crianças vão parar em Nárnia, mas em uma época atribulada. O Rei Cáspian X já está muito velho e seu único herdeiro desapareceu há anos. Caberá às duas crianças, com a ajuda do paulama Brejeiro, buscar os sinais de Aslam e encontrar o príncipe desaparecido.

A Cadeira de Prata talvez seja o livro mais maduro e envolvente da saga As Crônicas de Nárnia. Bem, talvez esta seja minha opinião pelo fato de ter sido o primeiro livro de Nárnia que li. O enredo é enxuto e traz uma dinâmica envolvente. O foco na narrativa está em Jill. Diferente dos quatro irmãos Pevensie, a menina é mais como Eustáquio antes de seu primeiro contato com Nárnia. Bem, não quero dizer que ela tenha as características detestáveis do menino. Porém, Jill é mais humana, falha, real. Essa característica nos aproxima da personagem. Nos identificamos com ela. Seu primeiro contato com Aslam é especialmente tocante.

Outra personagem interessante é Brejeiro, o paulama. Com um pessimismo que se mistura a um terrível senso prático, ele nos encanta por sua curiosa personalidade. 

Mais uma vez o elemento alegórico cristão aparece. A imagem da fonte de água em que Jill mata sua sede representa a conversão seguida de um comissionamento, a ordem para uma missão. Apesar disso, o livro não perde seu sabor. Lewis é um exímio contador de histórias e a tradução de Paulo Mendes Campos torna o texto ainda mais saboroso.

Há muitos outros detalhes e mistérios, como os nomes de Aslam citados pelos centauros. Ou o próprio País de Aslam, a terra acima de todas as terras, um lugar situado a uma altitude inconcebível. Ainda assim, não se trata de uma região coberta de neve ou com o ar rarefeito, como seria o caso.

Nárnia continua um local envolvente e cheio de um charme selvagem, agreste. Seus habitantes, a maioria inumanos, nos conquistam com sua simplicidade e comicidade.

A Cadeira de Prata é  um livro que nos envolve do início ao fim. O elemento do perigo real reaparece nesse livro, diferente do que percebi em Príncipe Caspian. Não são crianças brincando de guerra. São pessoas enviadas a uma região inóspita, hostil, com o perigo de gigantes ferozes e o inverno inclemente. Neste livro, os elementos atuam como cruéis inimigos. E nesse ponto, a despeito de seu pessimismo, Brejeiro surge como um aliado inestimável. E não é apenas nessa vez que ele salva o dia. A abnegação do paulama, as decisões que ele toma pelo grupo fazem com que a gente aprecie ainda mais sua presença.

Com elementos romanescos de uma jornada de resgate repleta de perigos, a envolvente narrativa de A Cadeira de Prata nos seduz completamente. Uma aventura empolgante para qualquer idade. Um livro inesquecível, uma jornada a ser lembrada, como os próprios Sinais de Aslam. 


Ficha Técnica

A Cadeira de Prata

As Crônicas de Nárnia # 6

C. S. Lewis

ISBN: 8522616198

Ano: 1997 

Páginas: 208

Idioma: português

Tradução: Paulo Mendes Campos

Editora: Martins Fontes


Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/a-cadeira-de-prata-1104ed1474.html

segunda-feira, janeiro 02, 2023

A Viagem do Peregrino da Alvorada - Sobre jornadas sem retorno



O menino se chama Eustáquio Mísero. E faz por merecer esse nome. Tem comportamentos extremamente práticos e adora debochar de seus dois primos, os irmãos Lúcia e Edmundo Pevensie. E o deboche piorou quando descobriu que os dois compartilham um segredo: as viagens ao país mágico de Nárnia.

É claro que Eustáquio não acredita que os primos tenham viajado para outro mundo. Essa certeza torna o deboche ainda mais saboroso para ele. Fato é que o menino não suporta aqueles dois, e o sentimento é recíproco.

As férias teriam sido uma tortura para os irmãos Pevensie, hospedados na casa de Eustáquio por motivo de força maior, não fosse o quadro pendurado no quarto em que os dois dormem. Trata-se da imagem de um belo navio a remos, com uma cabeça de dragão na proa, navegando em um mar maravilhosamente tranquilo. 

Lúcia e Edmundo acreditam que aquele é um navio de Nárnia. Por isso, investem todo o tempo possível a contemplá-lo, perdidos em nostalgia. Eustáquio, em muitos desses momentos, aparece para debochar deles. Mas então, em um desses episódios, a magia acontece, provando que os irmãos tinham razão.

Aquele é mesmo um navio de Nárnia, levando ninguém menos que o próprio Rei Caspian, o herói do livro que leva seu nome em As crônicas de Nárnia. Caspian está em uma missão de busca pelo paradeiro dos fidalgos amigos do seu pai, os quais foram banidos para o mar por Miraz, o tirânico tio do rei. Acompanhando essa jornada está Ripchip, o Rato, aquele mesmo que operou feitos heroicos no livro anterior.

Assim tem início A Viagem do Peregrino da Alvorada. É talvez um dos mais épicos livros da série, no seu sentido estrito do termo, pois trata de uma jornada grandiosa e que tem a sua cota de perigos. Dragões, monstros marinhos e criaturas invisíveis estão entre esses percalços que os viajantes terão de enfrentar. Sem falar no maior e melhor dos perigos: Aslam, o Grande Leão.

O livro é uma delícia de se ler e acrescenta mais alguns à grande galeria de mistérios do mundo de Nárnia. Estrelas descansando em ilhas, frutos do Vale do Sol, a Faca de Pedra na Mesa de Aslam são alguns desses mistérios. A jornada em si é um grande mistério, podendo ser vista em seu teor figurativo. Ninguém pode negar o tom alegórico dos livros de C.S.Lewis, conhecido pregador cristão. Com isso, podemos pensar na jornada do Peregrino da Alvorada como uma escalada espiritual.

Outra grande alegoria está na metamorfose de Eustáquio. A narrativa tem seu início com foco no menino, mas esse foco se desprende dele e muda para Lúcia. Durante a maior parte do tempo, Eustáquio é insuportáel. Ele não é apenas um péssimo sujeito para os familiares, mas uma compahia odiosa. Há um propósito para que Eustáquio embarcasse nessa jornada e esse propósito é uma das alegorias mais belas de toda a série.

A despeito dessa beleza, gostaria de problematizar a construção da personagem Eustáquio. O livro apresenta o menino de um jeito que me faz pesar que ele e sua família são progressistas "caricaturizados". São descritos como "gente moderna, de ideias abertas". Pelo contexto, dá para perceber que a descrição é negativa e nem um pouco elogiosa.

A despeito desse problema, o livro continua delicioso de ser lido. Com aventuras, mistérios e muita magia, A Viagem do Peregrino da Alvorada é diversão certa, mesmo que seja uma alegoria religiosa.

Ficha Técnica:

A Viagem do Peregrino da Alvorada

As Crônicas de Nárnia # 5

C. S. Lewis

ISBN-13: 9788533616189

ISBN-10: 853361618X

Ano: 1997 

Páginas: 235

Idioma: português

Editora: Martins Fontes

Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/a-viagem-do-peregrino-da-alvorada-1103ed1471.html

segunda-feira, dezembro 26, 2022

Príncipe Caspian - Guerra Civil no País da Fantasia


Nárnia está em guerra. De um lado, estão os descendentes de um país chamado Telmar, os telmarinos, os quais dominaram Nárnia por séculos. Do outro, os chamados antigos narnianos: animais falantes, centauros, anões, faunos. As árvores não entraram na guerra: estão adormecidas.

O líder dos antigos narnianos é o telmarino Príncipe Caspian. Criado ouvindo os relatos dessa Nárnia encantada, o menino tem sobre seus ombros o peso de liderar um exército contra Miraz, seu tio, um homem cruel e perverso que usurpou o trono do pai de Caspian.

Mas este nem é o início da história. Príncipe Caspian, quarto livro de As Crônicas de Nárnia, tem seu início com os quatro irmãos, Pedro e Susana, Edmundo e Lúcia, sendo transportados para uma ilha desconhecida, nas proximidades das ruínas de um misterioso castelo. Logo descobrem que se trata de Cair Paravel, onde reinaram por uma vida inteira. Um ano se passou desde as aventuras vividas em O leão, a feiticeira e o guarda-roupa.

Mas e o que os quatro irmãos têm a ver com o jovem Caspian? Isto o leitor terá que descobrir.

De longe, este é o menos charmoso dos livros da série. Caspian não é lá muito carismático, faltando-lhe uma personalidade mais forte. Ele parece um menino influenciado por sua ama e seu tutor, sem no entanto parecer realmente interessado em Aslam. O próprio leão não parece ligar muito parar ele. O criador de Nárnia demonstra interesse de brincar de esconde-esconde com os quatro irmãos, além de apavorar o anão Trumpkin.

Por falar nesse anão, trata-se de personagem digna de nota. Valente, corajoso, habilidoso e sempre fiel, Trumpkin não esconde sua decepção ao conhecer os quatro irmãos, os tão grandiosos reis e rainhas de tanto tempo atrás. Tanto que cada um tem que mostrar alguma habilidade para convencer o cético anão de que a grandeza dos quatro não se trata de mera conversa fiada ou uma antiga lenda.

Outra personagem memorável é o rato Ripchip, com sua orgulhosa valentia e prontidão para a batalha.

E por falar em batalhas, creio que este é um dos motivos do livro não ser tão interessante. A descrição das lutas é genérica e sem sabor. Não há suspense ou aparência de perigo real. Com isso, parece que todos estão brincando de guerra e não em embates reais e perigosos. A narração de um certo duelo chega a ser uma tentava de dar sabor de aventura ao livro, mas tal tentativa é muito tímida. E não estou falando da luta de espadas que Edmundo trava com Trumpkin. Essa, sim, é interessante.

Apesar desses pontos negativos, mesmo o enredo não ser dos mais emocionantes, conta coma estética apurada de C.S.Lewis. Trata-se de uma narrativa que tem seu sabor nos diálogos e na dinâmica mostrada entre o anão Trumpkin e os quatro irmãos.

Portanto, apesar de ter alguns pontos desinteressantes, o livro se salva pela maestria de Lewis em contar histórias.

É importante também destacar que há o conflito na ausência das dríades e náiades, das deusas e deuses da floresta, ou seja, os espíritos das árvores, que se encontram adormecidos. A resolução desse conflito é graciosa e emocionante.

Com um enredo que, embora careça de emoção, tem seus atrativos através do humor e da envolvente narração, Príncipe Caspian é um livro que pode até não ser apaixonante, mas temo o seu lugar.

Ficha Técnica

Príncipe Caspian

As Crônicas de Nárnia # 4

C. S. Lewis

ISBN-13: 9788533616172

ISBN-10: 8533616171

Ano: 1997 

Páginas: 216

Idioma: português

Editora: Martins Fontes

Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/principe-caspian-1101ed1466.html

terça-feira, dezembro 20, 2022

O cavalo e seu menino - O fascinante oriente ao sul de Nárnia


Shasta se considera um desafortunado. Apesar de ter alguém a quem chamar de pai, o menino sofre com a exploração a que esse suposto pai o condena. Quando não é o trabalho extenuante, são as surras severas a que ele é submetido. Vivendo numa choupana ao sul do Império Calormano, o menino tem uma existência muito infeliz.

Seu destino, porém, começa a mudar justamente quando seu pai adotivo concorda em vendê-lo para um tarcaã, um senhor calormano de alta linhagem. Mas não é a transação que oferece a Shastra um novo destino, mas a montaria do senhor calormano. Sim, o cavalo do tarcaã se chama Bri e ele é um legítimo narniano, possuindo a habilidade de falar. E assim, Bri convence Shasta que a vida com o tarcaã será ainda pior que aquela que o menino tinha com o pai adotivo.

A proposta de Bri é ousada. Um cavalo sem cavaleiro seria rapidamente capturado. Com um o menino a montá-lo, a chance de passarem despercebido seria muito maior, ainda que ele chame atenção com sua pele branca.

Assim, começa a grande aventura de O cavalo e seu menino, terceiro livro de As Crônicas de Nárnia. Nele, C.S.Lewis ambienta a narrativa em um país que lembra o célebre califado de Haroun Al Rashid, de As Mil e Uma Noites. Os nomes das pessoas, do deus da Calormânia, da cidade que faz vezes de capital e até do soberano desse pais, tudo tem elementos que se inspiram no oriente fantasioso do famoso califa.

Apesar do evidente racismo no qual Lewis constrói sua narrativa, afinal a maioria dos calormanos é vil e cruel, há uma riqueza ímpar nesse país imaginário, com referências claras à literatura árabe, à cultura oral, aos montes de poetas que são citados em suas máximas de sabedoria. A Calormânia é de uma riqueza cultural que nos fascina e diverte. Lewis emula até mesmo a oratória e a habilidade de contar histórias, estética que faz referência direta a Sherazade.

A narrativa, cronologicamente, acontece durante O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, pois transcorre durante a Era de Ouro de Nárnia, no reinado de Pedro, Susana, Edmundo e Lúcia.

Mais uma vez preciso ressaltar o racismo velado. A cor da pele dos calormanos é constantemente assinalada como mais escura que os humanos dos reinos do norte, Arquelândia e Nárnia. As pessoas desses dois reinos são brancas. Esse antagonismo me incomodou muito.

Lewis poderia ter criado um universo sem que fosse marcado um antagonismo assim. Não é porque a Idade Média teve as Cruzadas que o mundo de Nárnia deveria ter um inimigo árabe. A proposta de riqueza cultural da Calormânia é algo lindo e fascinante. O mundo de Nárnia poderia ter seus vilões e inimigos sem que estes representassem toda uma cultura, vilanizada justamente por ser diferente.

Acredito que infelizmente C.S.Lewis incorre no erro de muitos europeus, esse eurocentrismo branco, caucasiano e helenista. Destaco que no mundo em que existe Nárnia, há um Oriente Médio, mas não há uma África. E isso eu considero ainda mais problemático, com o apagamento de toda uma variedade de etnias que poderiam ter enriquecido o universo em que Nárnia está inserida.

Feitas essas ressalvas, o livro foi bastante divertido. Mergulhei no drama de Shasta, em uma jornada de herói torto que aprende que os acasos são todos obra de Aslam e que, ainda que aparentemente vários leões surjam, na verdade há somente um leão.

Outra coisa que me encantou foi a presença das rainhas de Nárnia crescidas e envolvidas nos perigos da diplomacia. Lúcia está especialmente encantadora em sua armadura e sua participação nas batalhas mostra que Lewis se dispôs a revisar sua posição machista de impedir mulheres de lutar nas guerras.

Apesar de seus problemas, O cavalo e seu menino tem a riqueza de detalhes e estética que colocam este livro talvez no patamar de encantador primeiro lugar entre as demais crônicas. Uma obra que nos encanta por sua riqueza de referências.

Ficha Técnica

O Cavalo e seu Menino

As Crônicas de Nárnia # 3

C. S. Lewis

ISBN-13: 9788533616165

ISBN-10: 8533616163

Ano: 1997 

Páginas: 189

Idioma: português

Editora: Martins Fontes

Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/o-cavalo-e-seu-menino-1099ed1462.html

sábado, setembro 24, 2022

Um convite

Para quem não sabe, sou escritor. Um dos gêneros que mais amo (sim, esta é a palavra) é a Literatura de Fantasia. Tanto que de vez em quando me aventuro em histórias de magia. Tenho uma narrativa longa em fase de construção. Está em meu blog, com 11 capítulos disponibilizados para a leitura. Pretendo disponibilizar tudo, à medida que vou escrevendo. 

O que mais me incentiva a escrever é justamente os comentários das pessoas. Esses comentários mostram que elas estão lendo. Tendo quem leia, sinto uma energia enorme para continuar a escrever.

Assim, convido a todas e todos que deem uma olhada nessa história. Chama-se "O Viajante Cinzento". Nela, misturei ao elemento de fantasia a presença macabra de zumbis. Espero, sinceramente, que as pessoas sintam-se curiosas para mergulhar nesse mundo mágico, assim como eu mergulhei, enquanto escrevia.

Quem conhecer um amigo que curte fantasia, sinta-se à vontade para mencioná-lo nos comentários ou para compartilhar o link em sua linha do tempo. Será um grande incentivo para mim! Obrigado!

terça-feira, dezembro 28, 2021

O Imundo - Parte IV de IV

Ir para Parte III de IV


Minutos se passaram. Seridath, coberto de suor avermelhado, já estava sem escudo e o punho de algum gigante tominaro havia arrancado seu capacete, quase esfacelando seu crânio. Apesar de tudo, exceto alguns cortes leves, ele estava inteiro. Mas sentia-se estranho. Um punhado de kowas jazia aos seus pés e ele continuava disposto. Na verdade, tinha mais energia do que quando começara a batalha, uma disposição que beirava a excitação. Até estranhou quando, com um jogo de corpo, lançou um dos homens-porco a uma considerável distância. Estava também mais rápido, agia por reflexo, sem pensar, atingindo um pescoço ou uma virilha, perfurando pelas juntas da armadura de algum inimigo ao seu lado, lançando o corpo para trás enquanto desviava-se do poderoso ataque de um punho enorme.
Era o tominaro novamente, um gigante de cinco a seis metros, pele extremamente rígida, que repelia cortes e estocadas. Seridath era constantemente assaltado pelo pensamento de que deveria matar aquele gigante, mas ainda não havia conseguido uma oportunidade de bater-se com ele de maneira adequada. Aquele monstro era forte e resistente, um golpe de reflexo não iria perfurá-lo facilmente.
Mas algo dizia a ele para esquecer os "porcos" e concentrar-se no gigante. Com uma careta, fez Lorguth ser lançada para frente, como um bote de serpente, abrindo a garganta do kowa que o atacava. O oponente tentou segurar o sangramento, mas suas pernas fraquejaram e ele ajoelhou-se, obstinado. Por trás dele, Seridath viu que o gigante o espreitava para um novo ataque. O rapaz correu rumo ao titânico oponente. Escalou o kowa, que já estava morto, mas havia permanecido de joelhos. Antes que o corpanzil tombasse com o seu peso, Seridath apertou o punho da espada com as duas mãos e de um salto lançou-se sobre o peito do gigante. O tominaro olhou com surpresa ante a audácia do jovem. O potente soco errou Seridath por um triz. O rapaz continuou seu trajeto e, empregando toda a sua força em ambas as mãos, enterrou a lâmina bem no olho direito de seu inimigo.
Então aconteceu. Era como sentir seus braços sendo moídos por tanto poder. A dor passou para todo seu corpo, como se o mesmo fosse explodir, ou ser esmagado, ou ambas as coisas no mesmo segundo. Então a dor aliviou, mas permaneceu de forma tênue. Mesmo morrendo, o gigante tentou permanecer de pé, até ceder e tombar pesadamente no chão já coberto de inimigos abatidos.
Com Lorguth ainda presa ao olho do inimigo, Seridath quase não percebeu a oscilação e lenta queda. Deixou-se ficar por algum tempo deitado sobre o tronco do gigante. Estava tão atordoado que também não notou que os inimigos permaneciam ao seu redor, fustigando-o com machados e clavas. Mas sua pele estava rígida demais, os danos eram insignificantes. O rapaz se ergueu lentamente, recuando as lâminas inimigas, chegando a quebrar as hastes de alguns machados. Com um leve movimento de braços, ele atirou para o ar aqueles que o importunavam, fazendo-os voar sobre as cabeças dos outros tominaros, que atropelavam seus próprios aliados para vingar a morte de um de sua raça. "Agora, o povo exilado, o povo do poder" pensou ele. Não sabia quem eram esses, mas seu corpo moveu-se como que por instinto, atravessando o campo de batalha como se estivesse correndo livre na campina. Os inimigos sendo destruídos como se fossem incômodas moitas de mato.
Subitamente, ele deparou-se com uma daquelas criaturas vestidas com seus mantos brancos. "Ah, então esse é um do povo exilado." O ser rapidamente emitiu um "HAH", enquanto um forte feixe de luz partia rumo a Seridath, que bloqueou o ataque com Lorguth. A lâmina chorou, emitindo um forte som agudo e melancólico. Em meio ao espanto e à discreta satisfação de ver a espada sofrer, o rapaz ergueu-se e, fazendo sua tradicional finta para a esquerda, decepou os dois braços do ser antes que ele fizesse um segundo ataque. O seirane gemeu e fez uma hedionda cara de sofrimento. Sua última expressão, pois logo em seguida Seridath enterrou Lorguth na junta de suas costelas. A espada bebeu com satisfação aquela poderosa alma. A criatura explodiu em uma descarga de luz, enquanto mais dor penetrou no corpo de Seridath, desacostumado em receber tanto poder.
Agora, porém, ele sentia algo grandioso permeando seus membros. Os inimigos o rodeavam, mas somente os zumbis insensíveis ainda tentavam, sem sucesso, atingi-lo. Os vivos hesitavam, até mesmo os orgulhosos tominaros mantinham uma temerosa distância. O cavaleiro estendeu a mão esquerda. O poderoso relâmpago surgiu de seus dedos e destroçou os oponentes em seu caminho. Seridath deixou um sorriso leve brotar de seus lábios. "Agora estou pronto. Devo ir em busca daquela alma, Lorguth. Daquela alma que você tanto quer."
Aldreth observava atônito seu amo causar um enorme caos no exército de mortos. Naquela batalha, a confusão imperava. Não havia palavras de comando ou toques de trombeta. O exército de Dhar e a legião maligna engalfinhavam-se como uma só turba convulsa. Gritos de pânico e desespero eram sobrepostos pelos brados de horrendas criaturas. Muitos homens valorosos morriam naquele dia. Homens aleijados arrastavam-se para fora da luta, chorando, pedindo por suas mães, amaldiçoando os deuses. A Companhia ainda conseguia manter sua formação, uma linha cerrada com três camadas de escudos sobrepostos. O exército de Dhar, porém, havia sido reduzido quase à metade e o próprio estandarte do rei oscilava. Mesmo uma vitória seria cara demais para aquele reino. A batalha em frente às campinas de Arnoll seria uma lembrança amarga ao longo dos anos.
Enquanto isso, Seridath acabava de penetrar nos limiares do pavilhão central. Já havia bebido as almas de outros gigantes e meio-gênios. O jovem corrigiu o pensamento. Fora Lorguth quem bebera. Ele somente estava lutando por sua vida, enfrentando seus inimigos, só isso. Enquanto pensava, o jovem agia de forma contrária, estraçalhando quem estivesse à sua frente, fosse através da lâmina amaldiçoada, fosse pelos raios ou pela força bruta. Seus servos permaneciam ao seu lado, enquanto os sessenta bandidos já haviam sido destruídos. Os kowas e tominaros mortos levantaram-se, de forma que as forças de Seridath já tornavam-se uma horda que destruía as entranhas do exército maligno. A cada segundo, o cavaleiro ficava mais surpreso em como os servos eram úteis em batalha. Ágeis, fortes, obstinados, fiéis. Bem, fiéis nem tanto, assim como Lorguth. Mas para tudo há seu jeito.
Seus pensamentos pararam quando ele percebeu algo em sua mente. Olhou ao redor e viu-se em uma nuvem brilhante, de cor carmesim. Era a aura daquela alma que despertava os desejos de Lorguth. Era a própria mente do inimigo, expandida, envolvendo o jovem e sua espada. Seridath sentiu a hostilidade daquele ser. Sim, ele era considerado um incômodo, um inconveniente obstáculo. Mas o rapaz então percebeu outra coisa. Um temor, misto de surpresa e incredulidade. Então era isso. Sentiu satisfação ao saber que começava a ser temido.
De súbito, os mortos-vivos ao seu redor afastaram-se. À sua frente, kowas, tominaros e outros seres também foram recuando, abrindo espaço e formando um corredor. Através dele surgiu um outro ser. Um poder opressivo apertou o coração de Seridath, a ponto dele sentir que iria morrer. Olhou para frente, a forte luz carmesim quase o cegava. O rapaz decidiu voltar à sua visão normal e foi tomado de surpresa. Lá estava ele. Era um homem vestido com uma espécie de toga bem leve. Sua pele era enrugada, como se ele fosse incrivelmente velho, e tinha cabelos bem escassos. Mas não era somente isso. Ele se aproximava com os pés esticados, como se estivesse na ponta dos dedos, mas sem tocar o chão. Segurava uma pesada espada, de lâmina larga e espessa, à altura do peito, deixando-a pousar no ombro direito. Mas o detalhe mais marcante o fato de que aquele ser não tinha olhos, nem pálpebras. Dois redondos buracos escuros ocupavam o lugar dos globos oculares, o rosto de uma caveira ainda coberta com sua pele.
Um pensamento veio forte à mente do cavaleiro, distinto e urgente, como uma súplica infantil. "É ele! O Urd!" Mas não era somente Lorguth que o queria. Seridath desejava a glória de ter destruído o líder daquele exército. O ser olhou do alto, sua boca com uma expressão que beirava o desprezo.
– Desloquei-me do centro de meu pavilhão para dar-te as boas vindas – começou a dizer a criatura – mas então descubro que o ser poderoso a atrasar meu exercício é um simples humano. Tens sorte por carregares essa lâmina, garoto.
– Não sou um garoto, imundo. Não sabes o que eu sou de fato. Mas eu sei quem tu és, Cormorant!
– Ah, que agradável surpresa – o Urd, o Imundo, falou em tom de gracejo –, de fato tens sido por ela informado. De fato, é um privilégio usá-la. Mas saber meu nome não muda a situação, de fato. Tu és fraco para os poderes de Lorguth, larvinha. Não me dirige esse olhar espantado, garoto, pois sabes que é impossível que um ente antigo e poderoso como eu não saiba de Lorguth.
– Sabes então que chegou o dia de teu fim – bradou Seridath, ameaçador, mas em seu peito algo o alertava que havia informações omitidas por Lorguth. O ser soltou uma gargalhada altiva.
– Meu fim? Não sabes o que dizes, menino. Nós não temos fim! Já fomos erguidos para lutar outras épocas, e o seremos, sempre que necessário. Se fosse possível a ti matar-me, apenas estaria submetido a outro senhor, pois minha alma há séculos está amaldiçoada. Ora, não creio que tu sejas capaz de sequer cortar minha pele. Enfrenta o teu inexorável fim!
O ente mergulhou com uma rapidez incrível rumo a Seridath, a lâmina pesada de sua espada apontada para o peito do rapaz. Em meio à surpresa do ataque, foi impossível ao jovem esboçar reação alguma. Apenas sentiu em seu peito como era afiada aquela rústica lâmina. 
E o último pensamento do altivo guerreiro foi a certeza do definitivo desfecho daquela batalha.


Fim...? 

segunda-feira, dezembro 27, 2021

O Imundo - Parte III de IV

Ir para O Imundo - Parte II de IV


Um baque forte lançou-o longe e seu corpo rolou sobre o escudo, trombando e derrubando o que deveriam ser corpos de inimigos. A primeira coisa que fez foi verificar se estava ferido. A armadura invisível parecia fornecer alguma proteção, pois a cota de malha havia resistido bem e o escudo estava somente arranhado. Apesar disso, a dor era aguda no ombro direito. Ao menos, não estava ferido. Tentou localizar seu poderoso agressor, mas as bordas do elmo limitavam sua visão. Seu esforço foi desnecessário, pois uma enorme criatura de quase dois metros de altura, corpo humano e cabeça de porco, abria caminho entre os zumbis para enfrentá-lo, com uma clava nas mãos. Seridath entendeu que fora aquela coisa enorme que o havia atingido com tanta força. "Mate-o! Enterre a lâmina bem fundo em sua carne!" pensou o rapaz para si mesmo, enquanto via pelos olhos da espada como era forte o sangue daquele ser vivo. Jogou-se contra o peito do brutamontes, enquanto Lorguth penetrava fundo naquela carne esbranquiçada. O monstro era um kowa, homem-porco das terras do Oeste longínquo. Logo o gigante caiu, Seridath viu-se cercado por vários outros. Estava cercado por um pelotão inteiro.
Com a respiração suspensa, Aldreth observava toda a movimentação da batalha, que se tornara uma confusa e hedionda mistura de corpos, sons de carne e ossos sendo rechaçados, gritos de ódio e desespero. Percebeu então um grande bando de umas quinze ou vinte criaturas mutantes, com suas cimitarras, correndo na direção dele e de seus companheiros. O jovem não hesitou. Entesou seu arco e deixou as flechas subirem com rapidez. Já havia derrubado três deles quando viu que já estavam próximos demais. O rapaz voltou a desembainhar a espada, embora tivesse plena certeza de que não escapariam. Ignorava os talentos de Thin, mas não considerava-se bom o bastante para enfrentar tantos inimigos. Lucan estava muito ferido e dentre eles o arqueiro acreditava que somente Uri era bom em combates corpo-a-corpo.
Mas antes que os inimigos os alcançassem, um punhado dos servos de Lorguth surgiram em seu encalço. Eram mais rápidos que as aberrações sem rosto. Aldreth suspirou aliviado quando viu as criaturas destruindo os inimigos com uma rapidez silenciosa e eficiente. Sentiu também uma discreta gratidão. Seridath não se esquecera deles.

***

Continua...

domingo, dezembro 26, 2021

O Imundo - Parte II de IV

Ir para O Imundo - Parte I de IV

A lâmina escura pareceu mudar de forma, contorcendo-se cada vez mais rápido, até tornar-se uma labareda nas mãos de Seridath. Uma forte chama negra e maldita agora crepitava nas mãos do guerreiro. De repente, a labareda inclinou-se levemente para o lado e bifurcou-se, até que uma forma feita de chama desmembrou-se da espada e partiu para longe. Enquanto afastava-se, essa língua de fogo assumia uma forma quase humana. Seridath entendeu. Era uma das almas que a espada havia roubado quando Seridath fizera sua vítima. Uma alma que agora partia em busca de seu corpo. Várias outras labaredas de almas mutiladas surgiram da da espada e partiram para ocupar os corpos apodrecidos mais próximos. Conectado com Lorguth, Seridath descobriu que aqueles quatro servos destruídos em Arnoll não foram efetivamente mortos. Eles ocupariam os corpos mais próximos para continuarem a servir seu senhor.
Enquanto Seridath mantinha-se naquele êxtase de descobertas, Aldreth observava perplexo, com os demais companheiros. Ele e os outros não podiam ver as chamas negras brotando da espada de seu senhor e as labaredas amaldiçoadas buscando corpos sem vida. Seridath era o único que experimentava aquele segredo.
E Lorguth acabava de transmitir uma informação valiosa. Os corpos dos bandidos que haviam sido lançados pelos muros de Arnoll jaziam próximos dali. Um acréscimo de mais ou menos sessenta homens seria interessante. Não teriam a força e agilidade dos servos mortos diretamente pela lâmina negra, nem poderiam retornar depois de destruídos, mas teriam alguma utilidade. Seridath, com um sorriso cheio de malícia e ambição, invocou esse poder. "Sim, minha querida, reanime esses corpos também."
Subitamente, Aldreth e os outros foram surpreendidos com o tropel de um enorme grupo que se aproximava por trás atrás deles. "Emboscados!" pensou ele, em pânico. Desembainhou a espada, enquanto Thin sacava sua adaga. Lucan ainda vacilava, mas Uri o havia largado para empunhar seu machado. Mas ao olhar para trás os dois rapazes e o anão viram uma enorme turba de bandidos ultrapassando-os e correndo rumo ao exército inimigo. Todos tinham o olhar vazio daqueles que já foram abandonados pela vida. Alguns corriam com as vísceras pendendo de suas barrigas ou se arrastavam, como animais quadrúpedes, enquanto outros estavam em bom estado, podendo até enganar alguém à distância, passando-se por vivos. Mas estavam todos bem mortos. O líder Berak, com a cabeça pendendo grotescamente para o lado, cruzou com o grupo dos guerreiros de Seridath. Thin bateu no ombro de Aldreth, enquanto observava Berak afastar-se com uma rapidez desengonçada.
– E pensar que eu poderia ser um desses, né? – disse o ladrãozinho, com um sorriso matreiro.
Aldreth suspirou, sentindo um misto de medo e alívio. Seridath mais uma vez o surpreendia. 
Em frente ao exército inimigo, o cavaleiro ergueu a flamejante lâmina. Não precisou gritar uma ordem de ataque. As criaturas agora o entendiam. O rapaz sentia-se ligado à mente dos "seus" mortos, como se fossem a sua própria. Flexionou os joelhos e partiu com velocidade rumo à ponta da formação de vanguarda inimiga. Aldreth observava, cheio de assombro. "Ele é louco!" pensou, "Vai morrer!"
Mas Seridath estava a poucos passos da linha de frente. Os [ragrans] não puderam disparar seus dardos antes que o jovem estivesse cara a cara com os primeiros inimigos. As criaturas de Lorguth já o alcançavam e com saltos medonhos lançavam-se sobre seus oponentes. Ossos e pedaços de carne apodrecida eram espalhados pela campina. Seridath jogou o corpo para a direita, enquanto fazia seu braço direito acompanhar o movimento e traçar um percurso horizontal, decapitando o zumbi à sua frente. Estava alegre, eufórico. Havia descoberto para que nascera. Era um Destruidor.
Seridath viu-se então cercado por criaturas com espadas de lâminas recurvadas e rostos disformes, aqueles mesmos que quase o mataram em Keraz. Então ele já fora localizado, oponentes mais fortes já haviam sido enviados para liqüidá-lo. Arrancou com a espada a perna direita de uma das criaturas, que perdeu o equilíbrio e tentou apoiar-se com uma das mãos, enquanto um braço desconjuntado sacudia-se, nascendo da perna ferida. O jovem pôs o pé esquerdo sobre o ombro do monstro e, com um forte impulso, lançou-se sobre as cabeças dos inimigos, para dentro daquela turba enlouquecida.

Continua...

terça-feira, dezembro 14, 2021

Lançamento: Uma visita inesperada - Samuel Medina e Luiz Henrique Evaristo




Finalmente saiu a divulgação do lançamento do meu mais novo livro: Uma visita inesperada. O texto de minha autoria traz o primoroso traço de Luiz Henrique Evaristo. O trabalho editorial d'a mascote, editora independente, foi imprescindível para que a obra ficasse tão linda. 

O livro está em pré-venda no site da editora a mascote até o dia 21 de dezembro.

As compras podem ser diretamente comigo (medina.samuel@gmail.com) ou pelo site da editora a mascote.

Conheça um pouco mais sobre o livro:










Mafalda, uma bruxa de idade avançada, é celebridade entre os bruxos. Ninguém sabe o segredo de sua juventude e ela, se sabe, não o revela. Quando uma visita inusitada bate à sua porta, será o momento de uma revelação que mudará o curso da vida da bruxa e também de sua enigmática visitante.

Lançamento:

Dia 21 de dezembro, terça-feira, às 19h.

Local: Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais - Praça da Liberdade, 21 - Funcionários, Belo Horizonte, MG.

segunda-feira, dezembro 13, 2021

O Imundo - Parte I de IV

Ir para O Embate - Parte V de V

Os cinco desceram com rapidez a encosta da colina, rumo ao campo aberto. Seridath dispunha de uma velocidade incrível, e já ganhava distância dos outros, correndo com rapidez mesmo com o pesado escudo pendendo em seu braço esquerdo e com a longa cota de malha cobrindo seu corpo.  O escudo era largo e comprido, de bordas na parte de cima anguloso em baixo. A cota de malha, formada por vários anéis de ferro sobrepostos, não era das melhores mas estava bem conservada. O rapaz parou de chofre de costas para Arnoll e diante do exército de mortos, que havia voltado a se mover rumo à cidadela. Num movimento brusco, Seridath desembainhou Lorguth e fincou a lâmina maligna no chão da campina. Emitiu sua vontade, enquanto sentia a espada vibrar. Estava para começar a batalha de sombras dentro de sua alma.
"Lorguth, quero que preste atenção. Hoje satisfarei sua vontade e enfrentar esse exército diante de nós. Caçarei a alma que você quer provar. Mas é a última vez que sua vontade se sobrepõe à minha."
A espada emitiu uma vibração tão forte que um som agudo e irregular tocou os tímpanos do rapaz, como se Lorguth imitasse uma forte gargalhada, zombando da ingenuidade do guerreiro, embora fosse impossível dizer se aquele som havia soado realmente ou se a lâmina amaldiçoada estava pregando mais uma peça na mente do jovem.
"Você pode rir. Mas se está sintonizada à minha alma, sabe que minha vontade é forte. Você irá se arrepender caso me contrarie novamente."
Lorguth parou de vibrar. Seridath acreditou que ela havia levado aquelas palavras a sério, embora fosse impossível saber. Tinha a consciência de que havia um longo caminho até dominar a espada, mas agora não dispunha do tempo necessário. Ordenou que a espada entrasse em ação. A lâmina vibrou novamente, excitada, fazendo Seridath sentir a palma da mão direita, que segurava a espada, formigar. O Viajante Cinzento viu um círculo se expandir a partir da escura lâmina e tomar todas as direções. Onde as bordas desse círculo tocavam, a paisagem mudava. O chão ficou negro, o céu vermelho qual sangue. Penetrando no plano espectral da espada, o rapaz passou a ver com outros olhos, com grande intensidade e nitidez.
Olhou para a esquerda, para o pequeno exército de Serpente Flamejante, que estava mais próximo a ele. Os corpos estavam transparentes, ele podia ver ossos, veias, corações com suas batidas regulares. E foi com grande surpresa que descobriu também a alma, um corpo dourado e brilhante, que permeava os limites de cada corpo físico. Assim também estavam seus quatro homens às suas costas e o exército do Senhor de Dhar.
Olhou para si mesmo e, para sua surpresa, sua alma não estava à mostra. Curiosamente, o rapaz permanecia coberto por uma armadura negra, sólida, com placas, manoplas e peitoral. Não era a velha cota de malha, mas uma armadura luxuosa pesada, destinada aos grandes senhores e cavaleiros de alto nascimento. Aquela armadura ilusória, visível apenas para ele, era a forma espiritual que o poder de Lorguth conferia ao seu portador. E ao ver-se vestido assim, Seridath sentiu-se um verdadeiro senhor.
Voltou sua atenção para o exército inimigo, cujo flanco direito já se envolvia em encarniçada luta contra os homens de Dhar, enquanto o flanco esquerdo era alvejado por flechas da Companhia. Os corpos reanimados dos mortos-vivos não tinham uma entidade corpórea e brilhante permeando-os, mas uma espécie de massa luminosa de cor azulada ou arroxeada, sem forma definida. Em alguns lugares, espalhados ou agrupados, havia pontos brilhantes, indicando almas vivas, como argros, os gigantes tominaros, kowas ou qualquer outra criatura viva que fosse integrante daquele exército.
Mas havia um outro ponto brilhante. Um corpo completo, luminoso, mas incrivelmente maior que qualquer outro em toda aquela horda. Sua cor era carmesim, forte, de forma que Seridath percebeu-a de bem longe. Estava situada no pavilhão central do exército inimigo e não dava indicações de mover-se. Sua aura expandia-se em ondas, indicando que o poderoso ser deveria estar, naquele momento, emitindo poderosos encantamentos. Seridath riu. "Então é essa a alma que você tanto anseia, Lorguth?" A espada vibrou de satisfação, confirmando as suspeitas do jovem. "Então vamos começar. Chame-os."

segunda-feira, dezembro 06, 2021

O Embate - Parte V de V

Ir para O Embate - Parte IV de V

As explosões ecoaram junto com os brados de júbilo dos moradores de Arnoll. Mais da metade do flanco esquerdo e parte da vanguarda foram destruídos nessa investida dos magos. Os gigantes e os meio-gênios, mais uma vez, não fizeram caso do ataque. Mas era uma cena perturbadora, ver argros e kowas em chamas, correndo e ganindo em desespero. No centro do exército sombrio, um ser maligno sorriu. O único que pôde perceber quantidade de pulsante energia liberada foi Seridath, pois Lorguth transmitiu-lhe um sentimento quase esmagador de poder emanado do exército dos mortos-vivos.
Subitamente, a alegria fez-se espanto, e logo medo aterrador. Começou com os gritos de um mago, que ergueu os braços, largando seu bastão, como se o mesmo o tivesse queimado. Os demais magos o olharam assustados, enquanto o homem que gritava aumentava seus berros, que se tornaram gorgolejos de sangue. Os olhos saíram das órbitas, uma fumaça fina emanou de sua boca, junto com sangue escuro. O homem parecia queimar por dentro e logo as chamas brotaram de sua pele, incendiando seu manto, enquanto ele desabava ao chão. Seus companheiros se afastaram, mas logo os berros recomeçaram e foram multiplicando-se.
Os fenômenos eram diversos. Um mago arranhou-se em loucura, enquanto outro parecia desmanchar-se como se derretesse. Na confusão que se tornara o esquadrão de magos, a única certeza era o sofrimento. Em segundos, praticamente todo o esquadrão se transformou em pedaços de corpos humanos espalhados pelo chão. Os poucos sobreviventes, cobertos de sangue, observavam atônitos a cena bizarra.
Todos pararam, inclusive os homens da própria Companhia. As cornetas voltaram a tocar. Os andarilhos de Serpente Flamejante dobraram seus corpos ao chão e emitiram uma série de cantos antigos, suplicando piedade aos deuses esquecidos de eras remotas. Uma névoa luminosa passou a envolver lentamente os guerreiros que compunham a Companhia. Por ordem das trombetas de Dhar, os lanceiros foram à frente, com rapidez, enquanto a divisão de clérigos, fortemente protegidos por pesadas armaduras, os seguiam carregando suas armas de quebrar cabeças.
As orações para dispersar mortos ecoadas pelos clérigos teriam poder para reverter a maldição, desorientando ou até mesmo destruindo os zumbis. Enquanto os homens de Dhar se aproximavam, alguns mortos-vivos começaram a sentir o efeito da aura dos clérigos, ficando desnorteados e saindo de suas formações. Lançadores de dardos disparavam setas a esmo, alvejando integrantes de seu próprio exército. A linha de frente dos mortos embaralhava-se. Alguns dos espinhentos ainda tentaram atingir os clérigos com seus dardos, mas os escudos da infantaria, somados à pesada armadura dos religiosos, ofereciam uma proteção quase perfeita.
Nisso, os meio-gênios, aqueles vestidos de branco, entraram em ação, tomando a frente dos poucos soldados zumbis que restaram no pavilhão que compunha a vanguarda. Estendendo para frente suas mãos finas e pontiagudas, dobrando os joelhos, eles abriram suas bocas e emitiram um longo "HAH", que veio acompanhado por um poderoso feixe de luz brotado de seus dedos. O raio luminoso pegou em cheio soldados e clérigos de Dhar, destroçando-os. A vitória tão lógica para o rei começava a tornar-se uma enorme derrocada.
Seridath desceu rapidamente, seguido de perto por Thin e Aldreth. Ao pé da árvore ele parou por alguns segundos. Uri e Lucan, que antes conversavam em voz baixa, cessaram sua conversa, aguardando ordens.
– Vamos, – disse o Viajante Cinzento a todos – temos uma batalha para enfrentar.

Continua...

domingo, dezembro 05, 2021

Os príncipes sapos

Um exército de guerreiros sapos que lutam por um beijo para se tornarem novamente humanos. Infiltram-se em casas de bruxas, enfrentam feras mágicas e dragões, cavalgam lagartos que correm graciosos sobre as águas. O líder é Rabert, o mais galante, garboso e destemido sapo que qualquer brejo já viu!


segunda-feira, novembro 29, 2021

O Embate - Parte IV de V

Ir para O Embate - Parte III de V

Três pavilhões dos mortos-vivos se uniram num perfeito sincronismo, formando um "v" invertido, a vanguarda como uma ponta de lança, que se estendia pelos dois flancos. Os lançadores de dardos claudicavam por cima da infantaria que ocupava a linha de frente. Os toques de ataque dos exércitos aliados foram simultâneos. "Pelo visto, eles querem mesmo ser heróis." pensou Seridath, ao ver praticamente todo o efetivo da Companhia mover-se rumo ao inimigo. Os arqueiros fizeram suas flechas descerem como uma chuva cortante contra os mortos-vivos, que ignoraram e mantiveram a marcha na direção da cidadela.
Vendo que o exército maligno estava decidido a ignorar as duas forças, o Senhor de Dhar sorriu ante a arrogância de seus inimigos. Deu ordem para que o esquadrão de magos entrasse em ação. Uma coluna organizada postou-se atrás da infantaria e iniciou uma série de invocações. Em segundos o céu tornou-se mais escuro e os últimos traços de claridade desapareceram sob espessas nuvens. Do céu, fortes relâmpagos desceram sobre as linhas inimigas, destroçando kowas, mortos-vivos, argros e qualquer outra criatura, viva ou não, embora os gigantescos tominaros e os pálidos seiranes tivessem permanecido inabaláveis. Nenhum dos gigantes ou dos seres de branco caiu.
Outra sequência de palavras arcanas surgiu dos lábios daquela poderosa multidão de conhecedores de magia. Esferas flamejantes surgiram do alto da cabeça de cada um deles e partiram rumo aos inimigos. Os arqueiros dispararam em conjunto e o céu cintilou com flechas incandescentes, fortalecidas e inflamadas pela magia.

Continua...

segunda-feira, novembro 22, 2021

O Embate - Parte III de V

Ir para O Embate - Parte II de V

As trombetas dos arautos da Companhia iniciaram uma seqüência de toques, tentando comunicar-se com os seus aliados. O exército de Dhar respondia com os toques de suas imponentes trombetas de prata, enquanto suas bandeiras davam repetidas voltas, em sinais combinados. Lucan conhecia aqueles sinais, mas ficara no pé da árvore.
– Os mortos estão em desvantagem – comentou Thin, com seu olhar aguçado.
– Isso é óbvio. – replicou Seridath, ríspido – Se o exército da Companhia for sacrificado, a vitória será garantida, já que o inimigo terá que lutar em duas frentes.
– Pelo que ouvi de Berak, o chefão que vocês mataram, – continuou dizendo Thin, com indolência – esse exército vem de Quirite-mon. Mas correm boatos de que há muito mais. Outro exército bem maior desses fedorentos partiu direto para o sul, para as planícies drenadas do reino de Marzan.
– A sombra se estende com rapidez. – replicou Aldreth entre um ar sombrio e infantil – O que faremos mestre?
– Nada por enquanto. – respondeu Seridath.
O rapaz via-se em difícil situação. Era evidente que Lorguth continuaria a contrariá-lo se ele não entrasse nessa batalha. O exército inimigo mantinha sua marcha constante e logo alcançaria os portões de Arnoll. Mas Seridath não deu ordem nenhuma aos seus homens. Por enquanto, estaria lá, observando. O exército de Dhar e a Companhia responderam à mobilização inimiga assumindo suas formações ofensivas. A batalha já era uma realidade.



Continua...

segunda-feira, novembro 15, 2021

O Embate - Parte II de V


Havia uma linha imensa das bizarras criaturas sem pernas e com braços mais longos que o corpo, aqueles malditos lançadores de dardos. Thin comentou rapidamente que eles eram chamados de ragrarans, os espinhentos. Atrás desses seres, estavam enfileirados zumbis uniformizados e armados com machados, martelos, clavas, maças e machetes. Eram colunas compactas, formadas por oito fileiras de vinte soldados cada. Logo além desses zumbis havia uma desorganizada turba de criaturas homanóides, embora tivessem um rosto que mais assemelhava-se ao de um suíno. Eram os kowas, homens-porco habitantes de Nareg, terra inóspita no extremo oeste. Misturados com os homens-porco estavam os seres abomináveis, de forma mutável, que carregavam espadas curtas. No momento, assumiam braços e pernas humanos, embora seus rostos exibissem feições perturbadoras de olhos e bocas que se misturavam. Eram chamados de Scliabs, mas também conhecidos como flagelos de Nibala, a Deusa da Loucura e do Engano. Mais para o interior de cada pavilhão, além dos desorganizados kowas e horrendos Scliabs, estavam os verdadeiros terrores daquele exército. Os gigantescos tominaros, que talvez chegassem a cinco ou seis metros de altura. Eram eles que tocavam os tambores. Vestiam calças revestidas com placas de ferro, embora mantivessem o tronco nu da cintura para cima. Tinham negros e longos cabelos, bem como barbas densas e revoltas. Seus rostos pareciam feitos de puro ódio, com olhos sombrios e ferozes.
Junto aos gigantes, contrastando com a cor escura do exército maligno, estavam homens e mulheres vestidos de mantos brancos e leves. Aliás, tudo neles era alvo como algodão, seus compridos e lisos cabelos, bem como sua pele. Ainda que parecessem humanos, qualquer que os visse negaria com veemência sua humanidade. Eram representantes de uma raça antiga, exilada há milênios de seu próprio mundo. Os seiranes, os portadores do poder, os jurados, também chamados de meio-gênios.
Nos espaços entre cada pavilhão, bandos de argros andavam de um lado para o outro, como se não tivessem lugar. Era uma força considerável. O exército inimigo chegava a quase doze mil seres.

Continua...