No dia 18 de junho de 2010, recebi uma mensagem de celular de uma amiga dizendo que o mundo havia se tornado um lugar pior, pois José Saramago havia partido. E foi com certeza o mesmo sentimento que tive quando soube do falecimento de Diana Wynne Jones.
Meu primeiro contato com a obra de Diana deu-se na verdade por caminho indireto. Apesar de ser um amante da literatura desde a tenra idade, conheci O Castelo Animado através de Hayao Miyazaki. Já naquele tempo era um leitor assíduo dos mangás, com minha cota de animes. Não há duvida que, nas animações, Miyazaki sempre esteve (e talvez sempre estará) no topo da minha lista.
E foi grande minha surpresa quando descobri que a animação era na verdade adaptação de uma obra literária. Costumo ser reticente quanto às adaptações, pois as considero muito irregulares. Mas o Mestre Miyazaki, não só criou uma obra-prima como também a fez inspirada em outra obra-prima.
O Castelo Animado, no caso o livro, é uma das leituras mais deliciosas que já tive em minha vida. Vai além de fruição, de prazer estético ou prazer da narrativa. É um texto sutilmente alegre, mas com suas doses de tragédia, claramente tecido por alguém que encontrou o prazer na vida.
Não restringi minha leitura apenas a um livro desta autora. Quando soube de outras obras dela traduzidas para o Português, não pude deixar de conferi-las. Adquiri Vida Encantada e As Vidas de Cristopher Chant, ambos da série Os Mundos de Crestomanci. Foi como se eu confirmasse uma certeza oculta. O mesmo traço alegre, a mesma pitada de tragéia, a mesma forma de construir enredos inusitados.
Não há dúvidas que Diana escreve para o público infantil. E essa criança está escondida tanto em um homem de 29 anos quanto em uma senhora de 80. Esse é a magia que movia seus livros, que podiam ser lidos por todos, pois tocavam naquilo que nos torna todos iguais: nossas almas.
Uma das marcas mais fortes na obra infantil desta escritora, presente principalmente na série de Crestomanci, é a solidão infantil, ou seja, a incompreensão dos adultos em relação às crianças. A falta de diálogo entre gerações. A infância, mesmo repleta de seus encantos, pode ser uma fase bem solitária e incompleta. Principalmente quando os adultos ao redor não conseguem assumir seus papéis de orientadores, conselheiros. Mas os personagens de Diana, embora em muitos aspectos solitários e perdidos, também representavam a busca pela superação, da inocência e da liberdade.
Diana nunca negou de onde tirava inspiração para seus livros. Professora, sempre rodeada de crianças, sempre buscando compreendê-las, ela aceitava de peito e mente abertos suas ideias, transformando-as nas mais belas histórias. Ela contava, por exemplo, que havia escrito O Castelo Animado a pedido de um garotinho, que havia pedido por uma história onde uma casa tivesse uma porta que pudesse ser aberta para vários lugares diferentes.
Em 2009, Diana foi diagnosticada com câncer e desde então lutava contra o tumor. No final de 2010, porém, ela decidiu interromper o tratamento, pois as dores estavam se tornando insuportáveis. Em 29 de março Diana partiu. No Brasil, onde seus livros ainda estão começando a se espalhar, sua morte passou quase despercebida, infelizmente.
Sinto muita tristeza ao saber que não mais haverá histórias do mago Howl, de Sophie, Cálcifer e dos outros incríveis personagens criados por tão criativa escritora. Também fiquei emocionado com o depoimento que Neil Gaiman fez em seu blog sobre a grande amizade com quem ele considera sua grande mestra. Gaiman não está errado. Certamente o mundo ficou mais triste e escuro sem a presença dela, que contribuiu para tornar as vidas de cada um de seus leitores uma Vida Encantada. Diana Wynne Jones foi uma grande Mestra e seu nome será jamais esquecido.
Diana Wynne Jones
Nascimento: 16 de Agosto de 1934
Morte: 29 Março de 2011