sexta-feira, agosto 31, 2012

Um Amor para Recordar


Confesso que quando li Um Amor para Recordar, ele ainda nem tinha este nome. Nicholas Sparks ainda era um autor desconhecido aqui no Brasil e seu livro tinha o título de Um Ano Inesquecível, fazendo parte de uma brochura da Reader's Digest em que cinco títulos faziam parte do mesmo volume.

Anos depois, Nicholas Sparks é um dos autores mais lidos no Brasil. Suas obras são um sucesso de mercado, tendo sido adaptadas para o cinema. Ainda assim, fico com este singelo livro, que foi uma leitura despretensiosa que me deixou profundamente envolvido.

Landon Carter é um adolescente que, no ano de 1958, não pensa em nada a não ser formar-se no colegial e ingressar numa boa faculdade. Mas uma inesperada paixão acontece e com ninguém menos que a filha do pastor da Igreja Batista da pequena cidade onde mora. Mas isso não é nada bom para Landon, que tenta fugir dessa situação constrangedora. Afinal, ele foi um dos garotos que sempre caçoaram do pastor de “pele de peixe” e de sua filha, Jamie. Por que agora seria diferente? 

Landon é forçado a conviver com Jamie, descobrindo que essa garota é muito mais do que Bíblia, oração e idas à igreja. Ele descobre que a jovem garota esconde um terrível segredo, que mudará para sempre a vida de todos ao seu redor. 

Uma narrativa simples e descontraída torna ainda mais saborosa a leitura de Um Amor para Recordar, uma história sobre como o amor supera todos os desafios.


Ficha Técnica
Edição: 1
Editora: Novo Conceito
ISBN: 9788563219633
Ano: 2011
Páginas: 186
Tradutor: Ivar Panazzolo Júnior

Página do livro no Skoob: http://www.skoob.com.br/livro/168033-um-amor-para-recordar

quarta-feira, agosto 29, 2012

Madrinha Morte, uma lição sobre o inevitável

A Morte, embora entidade temida, pode nos ser útil e ensinar grandes lições a nós mortais. Assim nos acontece em um dos contos dos Irmãos Grimm, “Madrinha Morte”, onde temos a história de um homem muito pobre que, ao ter seu décimo-terceiro filho, busca um padrinho perfeito para que a criança não passe necessidade.

Tanto Deus quanto o diabo são rejeitados como padrinhos, até que a Morte se apresenta e é aceita. Segundo o homem, a Morte seria a madrinha perfeita por tratar tanto ricos quanto pobres como iguais. Assim começa a grande lição que se revela através de uma história tão curta. O afilhado  da Morte, ao ter tão poderosa aliada, cresce para tornar-se um médico famoso por todo o mundo. Com a ajuda dela, o rapaz é capaz de dizer qual paciente irá se recuperar e qual irá morrer. Ter a Morte como Madrinha torna o rapaz presunçoso a ponto de ousar manipular sua aliada. E com isso ele causa sua própria destruição.

A grande lição que podemos retirar deste conto é que a Morte não pode ser subjugada, ou manipulada. O jovem médico busca usar de artifícios e argumentos, acreditando que a Morte o protegerá por ser sua Madrinha. Não poderia estar mais enganado. Como parte da ordem natural das coisas, a Morte não pode ser enganada e ir contra os seus desígnios inevitavelmente acabará mal.

Outro elemento importante a ser destacado é o motivo que leva o jovem médico a manipular a Morte. Sendo seu afilhado, era seu dever seguir seu exemplo, tratando a todos como iguais. Sua ruína começa quando, ao atender o Rei doente, olha-o como alguém importante, que não merece receber más notícias.
Visando vantagens particulares, o médico esquece do que é mais importante, inclusive quando busca ludibriar sua madrinha pela segunda vez, para salvar a vida da filha do Rei.

Assim, "Madrinha Morte" é uma importante lição moral sobre o valor da humildade e da importância da responsabilidade dos próprios atos.

segunda-feira, agosto 27, 2012

A Espada - Parte II de II

Ir para A Espada - Parte I de II


O viajante ergueu furtivamente a cabeça. A chuva havia amainado até tornar-se um fino chuvisco, mas o vento frio persistia. Cinco homens, montados a cavalo, aproximavam-se com um trotar quase desleixado. Dois deles carregavam lanças rústicas, com cabos feitos de faia, bem afiados. Todos, exceto um rapazinho louro e muito magro, tinham espadas embainhadas à cintura. Vestiam-se ordinariamente, com gibões de couro gasto e calças de algodão grosso. Apenas um deles vestia-se com mais esmero, pois suas roupas eram pretas, tinham belos bordados e pareciam novas. Uma bela capa preta amarrada sobre os ombros e um pingente de prata pendurado ao pescoço completavam sua figura. Parecia ser o que se pode chamar de líder do grupo e se mantinha à frente. O rapazinho louro era o mais escorraçado, por vestir-se apenas com uma túnica surrada e uma calça que parecia ser feita de pano de saco. Também estava descalço. Até seu cavalo aparentava ser o mais velho e maltratado. O viajante não imaginou que poderia despertar o interesse daqueles cavaleiros, mas eles o notaram ao longe, virando os cavalos em sua direção.
Encontraram-se ao pé da encosta. O viajante parou, enquanto os cavaleiros puxavam as rédeas de suas montarias, mantendo-se à distância de uns dez ou doze pés. O líder do bando olhava com um meio sorriso. Para bandidos inexperientes, aquele homem coberto de andrajos passaria por um mendigo. Mas o líder do bando sabia que mendigos só viajam em grandes grupos e sempre costumam ficar às voltas de cidades ricas. Já vira mais de uma vez cambistas avarentos disfarçarem-se de miseráveis quando desejavam viajar por aquelas regiões. E o homem permanecia silencioso, talvez estivesse suplicando a misericórdia dos deuses. Mesmo com a cabeça levemente erguida, era impossível ver seu rosto.
Enquanto era examinado, o viajante também estudou atentamente seus assaltantes. O líder do bando parecia ser mais velho, talvez trinta e cinco ou quarenta anos. Tinha olhos estreitos e cabelos grisalhos, com uma barba rala e nariz fino, quebrado. Seus companheiros não eram tão dignos de atenção. Pareciam-se com esses miseráveis comuns que infestam reinos decadentes e roubam aqueles que forem menos miseráveis que eles. Apenas o rapazinho atraiu o exame do viajante, pois não tinha armas, exceto um longo arco, já com uma flecha pronta para o disparo. Mas o olhar do garoto denunciava outra coisa. Estava amedrontado, provavelmente era a sua primeira incursão com o bando. Ótimo, um inimigo a menos.
O líder quebrou o silêncio:
O que faz sozinho nestas terras malditas, companheiro? – perguntou, de forma desinteressada.
O viajante ofereceu o silêncio como resposta.
Por acaso você é mudo, estranho? – vociferou o líder do bando – Estas terras são perigosas. Não há rei pra guardar esse buraco de merda. Nós somos a segurança. E você paga a gente se quiser passar.
Sombriamente, o estranho exibiu com certa sutileza a lâmina da espada, que a capa ocultava, como que alegando não precisar de proteção. Diante do ultraje, o líder do bando ficou furioso. Não lhe importava mais e aquele homem tinha ou não dinheiro. Iria arrastá-lo pela lama.
Então não precisa de proteção! – Bradou o bandido, sacando a espada.
O companheiro ao seu lado o imitou, enquanto os outros dois, que carregavam lanças, abaixaram-nas rumo ao estranho. Todos, exceto o tímido rapaz louro, soltaram gritos de fúria. Estava para começar o caminho real daquele misterioso viajante. Um caminho que, de cinzento, seria tingido de vermelho. 

Ir para Seridath - Parte I de II.

sexta-feira, agosto 24, 2012

O Saci - a fantasia brasileira em sua melhor forma

Um menino busca vencer seus medos, sendo levado a uma viagem fantástica em meio aos seres mais famosos do folclore brasileiro. Esta é a premissa do livro O Saci, do consagrado escritor Monteiro Lobato, reconhecido por várias gerações de leitores, adultos e crianças.

É impossível negar que a fama de Lobato precede seus livros. Quem dentre os brasileiros nunca ouviu falar do Picapau Amarelo, com Emília, Narizinho, Tia Nastácia, Visconde de Sabugosa, Dona Benta, Pedrinho, dentre tantos outros personagens inesquecíveis? A primeira memória evocada em cada um de nós, ao ouvirmos falar do Picapau Amarelo, provavelmente será da serie televisiva, cuja abertura era embalada pela voz inconfundível de Gilberto Gil. Mas muitos (como eu) foram levados a conhecer a fonte da serie, as histórias descritas nos diversos livros que contam as reinações da menina de nariz arrebitado com sua impossível boneca falante.

Como em poucos livros de Lobato, O Saci é focado especialmente em Pedrinho, menino oriundo da cidade grande, que no início do livro decide passar mais uma temporada de férias no sítio de sua avó, a bondosa Dona Benta. Pedrinho costumava se gabar de sua coragem, até ouvir falar de sacis. Desconfiado desses seres e desejando enfrentar seus receios, o menino conta com os conselhos do Tio Barnabé, um velho e sábio conhecedor dos segredos e tradições da roça.

É assim que Pedrinho consegue capturar um saci. Seu triunfo, contudo, é temporário. O menino acaba perdido na mata e deverá contar com a esperteza e a sabedoria do Saci para escapar de monstros como o lobisomem, a mula-sem-cabeça e a própria Cuca.

Através do Saci, o menino urbano vai sendo apresentado às nossas tradições, aos mitos do folclore brasileiro. O Saci assume um ar quase professoral, enquanto os mais diversos seres fantásticos atravessam a floresta diante do menino escondido. 

Lobato habilmente dá personalidade ao Saci, uma das poucas entidades folclóricas a penetrar nos lares sertanejos, como um agente que irá promover o retorno do indivíduo urbano a suas raízes autênticas. Assim, O Saci é uma obra peculiar, que valoriza o tom aventureiro e o elemento do perigo, sendo uma excelente forma da criança conhecer um pouco mais de nosso folclore com diversão garantida.

Ficha Técnica
Título: O Saci
Autor: Monteiro Lobato
Edição: 1
ISBN: 851119018X
Editora: Brasiliense
Ano: 2001
Páginas: 46

Página do livro no Skoob: http://www.skoob.com.br/livro/3115-o-saci

Observação: Eu utilizo este livro com frequência na biblioteca onde trabalho. Costumo oferecer uma oficina onde apresento para crianças de todas as idades tanto a obra de Monteiro Lobato quanto a riqueza de nosso folclore.

quarta-feira, agosto 22, 2012

Concerto

Ele havia dormido pouco na noite anterior. Como tudo na vida, havia pouco tempo para o sono. E principalmente na véspera do concerto. 

Preocupado com os preparativos, ele conferiu seu equipamento básico: partitura, terno azul risca de giz, camisa preta, sapatos e meias também pretos. A gravata prateada com a lâmina de uma boa espada, foi o último item conferido. A camisa preta, precisava ser passada. Colocou uma trilha sonora para embalá-lo enquanto ele deixava que vapor e metal transformassem a superfície irregular.

A noite foi passada em maio à apreensão. Estava pronto, sabia disso. Foram quase três meses de trabalho árduo, ensaios sobre ensaios. A música foi nascendo aos poucos, primeiro como sons esparsos e desconexos que aos poucos foram cerzidos pela hábil mão do Maestro. Agora, depois de tantas horas, chegava o momento tão esperado, quando subiriam ao palco.

Todo concerto é como uma batalha. Ele sorriu ante o pensamento tão clichê, enquanto conferia mais uma vez o teto untado de penumbra. Podia ser clichê, mas era uma verdade. Em um concerto, assim como em uma batalha, perder a concentração pode custar todo o trabalho empregado. Assim, buscando ao máximo essa concentração, ele adormeceu.

Dia seguinte, árduo e atabalhoado, quase cotidiano. Ele sabe o que o espera no fim do dia e cada segundo é como um ensaio mínimo, enquanto sua mente repassa sequências de notas e palavras cantadas em alemão. Ao final do expediente, parte rumo ao teatro: sua arena. 

Ao chegar, encontra os demais cantores já prontos, assim como a Orquestra. Enquanto ele veste seu uniforme, seu coração batuca num andamento bem mais veloz que aquele que o Maestro certamente aplicará

Mais um ensaio ocorre antes do concerto. O ensaio de palco é vital, deve ser rápido como o golpe de um guerreiro. Quanto mais tempo passado em um ensaio de palco, mais cansado o coro e a orquestra ficam. Tudo ocorre bem e o Maestro indica que tanto o Coro quanto a Orquestra estão prontos. Então todos deixam o palco.

Momentos correm lentamente em tensão e expectativa. Enquanto isso, ele está tão concentrado que parece nem ouvir o que se passa ao redor. A orquestra já retornou ao palco, afinando os instrumentos. É a vez dele e de seus companheiros. É a vez do Coro revelar sua presença ao público.

Eles chegam ao palco em maio a aplausos lançados da escuridão. A luz sobre eles impede que possam ver quem os aplaude. Assim é melhor, pois o único a ser visto é o Maestro.

E com a dignidade que lhe é devida, o Maestro assume as rédeas da realidade. Durante quase meia hora ninguém pensa, apenas sente. O silêncio toma conta do recinto. Naquela escuridão, todos são árvores, preocupados apenas na fruição descompromissada daquele momento. O tempo se expande e contrai, assume outras proporções. Enquanto as notas musicais adejam o espaço, palavras aladas, pedaços de sonho.

No momento em que o Maestro faz o último movimento e fecha as mãos num gesto poderoso, todos no teatro prendem a respiração. Num instante, o fôlego de todos está nas mãos de um único homem. É quando o Maestro abaixa os braços e todos sentem a tensão desaparecer, enquanto o público toma fôlego e explode em palmas entusiasmadas.

Então um pensamento atravessa a mente daquele corista, enquanto ele sente seus ombros relaxarem. Não haveria outro lugar onde desejaria estar.

segunda-feira, agosto 20, 2012

A Espada - Parte I de II

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Fonte: AutoRealm


Era uma tarde chuvosa e cinzenta, aquela. Nada se ouvia, além do som das fortes gotas de chuva, que caíam como se todo o céu fosse desabar. Ao longe, agudas montanhas circundavam aqueles caminhos solitários. A chuva era como um véu translúcido que embaçava a visão de montes escuros se estendendo até uma vasta campina que continuava, sinuosa, rumo ao sul.
Apenas um viajante andava por ali, uma figura cinzenta em meio à paisagem da mesma cor. Sua velha e arruinada capa o cobria, embora estivesse fechada à frente do corpo somente por uma faixa puída. Um capuz ligado à capa cobria seu rosto.
Volta e meia a capa abria-se pela força do vento, exibindo um físico bem talhado e seminu, com uma espada pendendo ao lado, junto à coxa esquerda. A arma não tinha bainha e estava presa por uma tira de pano que dava uma volta no ombro direito, por baixo da capa. O viajante inclinava a cabeça levemente para baixo, dando a ligeira impressão de que buscava ocultar o rosto de observadores indesejáveis. Seus pés descalços afundavam no solo lamacento, enquanto a capa cinza arrastava-se, impregnada pela lama avermelhada.
O viajante cinzento quase cambaleava, tamanho seu cansaço. Seu corpo alquebrado parecia não querer mais obedecer, e a chuva pesada empurrava seus ombros para baixo, como se buscasse lançá-lo ao chão. O frio penetrava em seus ossos pela capa encharcada, embora nem o incomodasse mais. Tudo o que ele queria agora era repousar, encontrar um lugar seco e quente. Comida e banho eram luxos com o quais se preocuparia depois. Mas sabia que sua longa jornada apenas começara. Simplesmente sabia. Pensamentos aumentavam seu cansaço e ele buscava evitá-los. Limitava-se a prosseguir em seu caminho, como um autômato.
A espada que pendia ao seu lado era feita de um metal negro e desconhecido. Era uma pequena espada bastarda, a lâmina serrilhada deveria ter cerca de meio metro. O cabo era feito de madeira enegrecida, da mesma cor do resto da espada. A guarda tinha forma de cruzeta, simples e grosseira, dois pequenos pedaços de metal afilados no meio e um pouco mais abaulados nas pontas. Havia duas discretas esporas brotando dos dois gumes, próximos à guarda. Logo depois dessas esporas, ambos os gumes eram serrilhados até quase o meio da lâmina.
Não havia nenhum enfeite, nenhuma pedra preciosa engastada, nada que pudesse tornar aquela arma uma peça valiosa. Era uma ferramenta apenas, feita para causar uma morte dolorosa. Uma arma para combates sujos. Mas para o viajante, aquela espada era mais preciosa que sua vida. Ele sabia, ou imaginava, o que renunciara para possuir tal arma. Sentia seu peito apertado por uma estranha excitação. Era o início, sua grande largada. Logo, teria o mundo.
Seu passado parecia obscuro em sua mente. Era verdade que ele realmente não se importava, não tentava lembrar nem como conquistara a espada. Mas se fizesse um esforço, se consultasse sua memória, apenas escuridão teria como resposta. A sombra em torno de um único nome: Koen.
Em sua insólita viagem, não havia encontrado nenhum ser humano pelas redondezas. Eram terras desoladas, aquelas, sem vilas ou plantações. Ao norte, além de montanhas brancas, havia o litoral inóspito. Ao sul, na direção em que o viajante seguia, estava a fronteira de um reino pobre e decadente.
Mas o viajante a tudo aquilo ignorava. Seus últimos cinco anos foram passados na escuridão, imersos nas sombras das montanhas que ele agora deixava para trás. Era uma cordilheira que se estendia por todo o litoral norte, para em seguida descer ao sul, formando um cinturão de montanhas que separavam o continente em duas partes. Sua jornada o havia impelido para o leste desse cinturão. Ele seguiria ao sul, sempre em linha reta, até que o destino mudasse sua rota.

sexta-feira, agosto 17, 2012

Sabor de Sangue e Chocolate

Sangue e Chocolate são dois elementos que se relacionam simbolicamente com o amor, simbolizando a relação carnal, a paixão. São também que carregam uma forte carga sensorial, tanto o cheiro pungente do sangue quanto o sabor forte do chocolate.

Helena Gomes, autora de Sabor de Sangue e Chocolate, constrói sua trama mediante esses dois fortes elementos. Assim, o romance nos apresenta Alex, um rapaz rejeitado pela própria família, que descobre, logo após um acidente, uma sede irracional por sangue humano.

Alex vive um dilema ainda maior e mais profundo. Sua mãe parece odiá-lo e seu pai age como um estranho. Aos 17 anos, no auge de questionamentos e da descoberta de sua própria identidade, o rapaz é levado pelo motorista da família, o velho Brandão, para a pequena cidade de Nova Guanaja, localizada no interior do Rio Grande do Sul. A ex-mulher de Brandão, Miranda, é uma simpática senhora, exímia cozinheira. Seu maior talento é a produção dos mais finos chocolates.

Vivendo nessa pequena cidade, Alex descobre novas possibilidades para sua sede de sangue como também para sua sede de amor. O rapaz se vê em um ambiente acolhedor, permeado pelo aroma saboroso do chocolate.

Essa nova família, contudo, corre um sério risco. A única neta de Brandão e Miranda, Claudia, é acometida por uma misteriosa doença. Este mal tem como principal sintoma uma profunda anemia. E Alex logo descobre que a causa pode ser pior do que qualquer ser humano imagina.

O texto de Helena Gomes é leve, acolhedor, delicioso. Ler seu romance é como saborear uma barra de chocolate. Prova da competência da autora, que marca muito bem a ambientação afetiva que ela busca criar na narrativa. O texto também é levemente picante, repleto de garotas belas, formosas e sensuais. A trama se constrói também mediante explorações sensoriais, que enriquecem a experiência do leitor e aprofundam sua relação com o protagonista. Outro ponto interessante a ser destacado é a presença leve de uma crítica aos romances adolescentes vampirescos.

Com um texto saboroso e personagens cativantes, Sabor de Sangue e Chocolate certamente vai deixar você com água na boca. 

Ficha Técnica
Título: Sabor de Sangue e Chocolate
Autor: Helena Gomes
Edição: 1
Editora: Escrita Fina
ISBN: 9788563877192
Ano: 2011
Páginas: 280

Página do livro no Skoob: http://www.skoob.com.br/livro/189526-sabor-de-sangue-e-chocolate


quarta-feira, agosto 15, 2012

O que as sombras revelam

A primeira sensação que o envolveu foi daquele frio cortante. A escuridão veio logo depois. Aquela era a hora em que todas as coisas pareciam mortas; a hora em que o próprio sono se assemelhava com a morte. 

O menino meio que retornou à vida, vindo de um efêmero país de sonhos. Aos poucos foi tomando ciência de seu próprio corpo. Os sentidos ajudaram-no a mapear seu espaço. Visão e audição faltaram a seu chamado. Afinal, estava imerso em silêncio, como numa escuridão sepulcral.

O frio fazia sua respiração arder. Privado dos aromas familiares, lembrou estar em lugar estranho. Aos poucos a lembrança foi acompanhando sua própria consciência. Não estou em casa; estou na fazenda, muito longe de tudo que conheço. E agora parecia também completamente sozinho. As sombras eram suas únicas e reais companheiras.

A bexiga protestou e o menino percebeu que este era o motivo de seu despertar. Ainda sob as cobertas, tentou mapear mentalmente a casa estranha onde estava hospedado com a família. Abriu e fechou os olhos, percebendo que não fazia diferença. Hesitou ainda por alguns instantes para em seguida jogar as cobertas e saltar da cama.

As tábuas do casarão colonial rangeram sob seus dedos, quebrando o silêncio que parecia uma parede de gelo a impedir que ele se movesse. Pé ante pé, o menino vagou, lentamente, usando as mãos para evitar uma topada violenta em qualquer coisa oculta naquele breu.

Chegando ao que parecia a sala de jantar, uma terrível surpresa. Uma luz vermelha, mortiça, desafiava o menino bem longe, lá onde a escuridão parecia nascer. Era um minúsculo ponto escarlate, como um olho maligno a observá-lo; ou como a brasa do cigarro de um fumante solitário, estranho.

O pavor gelou as entranhas do menino, quase fazendo com que sua bexiga se desprendesse. Encostando a mão esquerda no batente da porta que fazia divisa entre a sala de jantar e a de estar, ele parecia vidrado por aquele olho vermelho. Conforme se lembrava, a porta do banheiro estava à frente, um pouco à esquerda, na metade do caminho até a luz vermelha.

O menino viu-se diante de três escolhas. Poderia virar as costas para a luz e voltar ao conforto da cama, apesar dos protestos da bexiga, ou poderia vagar até o banheiro e ignorar a luz vermelha.

A terceira escolha, a mais difícil, foi a que ele fez. Com passos lentos mas firmes, o menino seguiu até a fonte da luz vermelha. O ponto luminoso foi crescendo até revelar-se apenas a luz que indicava o funcionamento do freezer da cozinha.

Sentindo um misto de alívio e orgulho, o menino deu meia-volta e dirigiu-se ao banheiro. De lá, seguiu para sua cama. As sombras da madrugada ocultam muito mais do que revelam, dão formas de monstros a coisas banais. Mas para o menino, pouco daquilo importava. Na luta com seus medos ele se saíra vencedor. E se tornara o senhor daquela madrugada... e o senhor do seu próprio coração.

terça-feira, agosto 14, 2012

Um ano de Cidade Suspensa



Publicar "A Cidade Suspensa" no blog foi uma experiência incrível. Compartilhamos opiniões, expectativas, impressões, ansiedades... Fiz amizades que perduram até hoje, sólidas. Para não deixar o momento em branco, convido a todos para este evento virtual, também uma oportunidade para os amigos que ainda não conhecem esta narrativa.

Como uma forma de deixar marcado este momento, convido a todos para uma comemoração virtual. Para tanto, basta clicar aqui: http://oguardiao.blogspot.com.br/p/a-cidade-suspensa.html. Deixe seu comentário para marcar sua presença. Pode ser um recado, faça uma brincadeira, mande um abraço para alguém. A premissa é a criatividade!

Abraços a todos!

segunda-feira, agosto 13, 2012

O Viajante Cinzento - Prólogo


 Derek escarrou no mar, esfregando as mãos em seguida para aquecê-las em meio ao frio da madrugada. O velho pescador olhou para a escuridão revolta e deixou seu olhar passear pelas ondas até a costa. Devia faltar pouco mais de meia hora para o nascer do sol e sua rede ainda estava vaiza. O pequeno barco de Derek flutuava a duas ou três mil braçadas da costa sombria. O mar estava mais escuro que o normal e as ondas faziam a embarcação oscilar de forma dramática. O pescador acabou de retirar sua rede da água e constatou que não pescara nada. Soltou um palavrão.
Aquele era um país próspero, diziam. Um reino belo, construído com sólidas estradas e cidades comerciais repletas de finas mercadorias. Derek lançou a rede e resmungou mais uma vez:
"Que Nibala me devore se essa porcaria de país for mesmo uma beleza como dizem."
O pescador nada sabia sobre tanta riqueza e conforto. Não naqueles tempos de crise. Houve época em que o peixe era abundante, cardumes enormes davam à costa e enchiam a mesa dos camponeses, deixando também cheios os bolsos do pescador. Agora, tudo era miséria. O norte parecia definhar lentamente. 
Do sul vinham histórias de campos verdes com plantações que pareciam brilhar como ouro. Aliás, estavam no fim da colheita e mesmo assim o trigo continuava caro como se fosse a própria merda da Nibala, a mulher-demônio. Não somente o trigo; tudo era caro no tímido mercado de Leidir, a aldeia onde Derek vendia seu pescado e comprava toda a mercadoria essencial para que ele e sua esposa Jeena sobrevivessem. E apenas sobreviviam.
Tudo ainda era bom demais no sul, com seus campos verdes e cidades tranquilas. Tudo era excelente naquele reino que diziam ter o melhor e mais bem equipado exército de todo o continente. As estradas seguras permitiam o intenso comércio. As leis fortes e justas protegiam até mesmo os pequenos mercadores. As estradas eram limpas e bem focadas. A riqueza, porém, estava ao sul e ao leste. Para o norte, nada havia a não ser o mar escuro e revolto.
Apesar do verão, tudo parecia piorar a cada dia. As tempestades deixavam o mar agitado como um corcel jovem e por duas vezes Derek deixara o vento carregar suas velas, para não perder o mastro e o barco de uma vez. Aquele era seu único sustento, se não quisesse migrar para o sul com a esposa e viver sua velhice como mendigo na populosa aldeia de Keraz ou até mesmo numa das grandes cidades do sul. Isso se ele sobrevivesse à viagem, é claro.
Diziam que o mundo acabava bem depois da costa e Derek nunca sentiu vontade de conferir. Alguns falavam de uma outra terra, onde demônios habitavam ruínas de antigos templos de luz. Isso, contudo, não fazia diferença para o pescador. Precisava de peixe, mas há meses eles praticamente desapareceram. Até mesmo gaivotas e albratozes haviam partido, em busca de águas que fornecessem mais alimento.
Derek suspirou, começando a recolher a rede, quando sentiu um forte puxão. Seu coração deu um salto. A força com que a rede fora puxada indicava que ele havia pescado algo grande, talvez um badejo, ou até mesmo um mero. Bufou com o peso, enquanto seus músculos se retesavam, lutando contra a rede. Depois de alguns minutos, finalmente o pescado pareceu cooperar e lentamente Derek puxou o conteúdo da rede para dentro do seu barco.
O pescador soltou um grunhido de surpresa quando viu a massa disforme que preenchia sua rede. Uma coisa escura se misturava entre as algas; não havia sinal de peixe.
– Mas que porcaria... – resmungou.
Ao que parecia, havia um braço humano enredado entre toda aquela massa disforme. O pescador friamente removeu o corpo da rede, retirando quase toda a lama e algas que o cobriam. Era um homem de idade indeterminada, com o rosto meio desfigurado, vestido do que restava de um gibão de couro e calças de linho. 
Derek já havia encontrado infelizes assim. Imaginou que talvez seria mais uma alma atormentada, cansada da crescente miséria, que buscara seu próprio fim lançando-se de um dos penhascos que havia a leste da costa. A corrente marítima bem poderia ter arrastado o corpo até ali. Interessado em vasculhar o morto em busca de algum objeto de valor, talvez um medalhão ou uma corrente de prata, Derek estendeu sua mão para o pescoço do afogado.
Com um bote súbido, o cadáver mexeu-se, agarrando com rapidez o pulso do pescador. Derek soltou um grunhido desesperado quando viu os olhos vazios do cadáver crisparem de fúria, enquanto a boca podre se fechava sobre sua mão numa mordida dolorosa.
Desesperado, o pobre homem lutou. Aquela coisa, aquela abominação, era mais forte do que se podia imaginar de um cadáver. A luta foi curta e atribulada. Os dois se embolaram no chão do barco, lançados contra cada lado da amurada pelo balançar intermitente das ondas. Num último e angustiado esforço, Derek conseguiu jogar seu atacante de volta ao mar. O morto atingiu a água num baque quase silencioso e rapidamente afundou nas águas escuras, arrastando consigo a rede.
Ofegante, Derek xingou outra vez, enquanto tentava conter o sangue que esvaía de onde antes havia os dedos anular e mínimo de sua mão direita. Seu coração parecia um tambor e ele tinha os tímpanos tampados pela pressão. O velho pescador tomou fôlego, olhou ao redor e, ainda em pânico, agarrou seus remos. Precisava voltar logo para casa. Se havia uma coisa como aquela na água, ele precisava garantir que Jeena estava bem.
Tentando de todas as formas ignorar a dor, Derek remou de volta à costa. Rezou a todos os deuses que podia se lembrar. A proa mutilava as cristas das ondas e o único som além do chapinhar das águas provinha dos grunhidos de esforço que o pescador fazia para vencer a distância que o separava da praia.
Derek não imaginava que no dia seguinte estaria morto.

Ir para A Espada - Parte I de II

sexta-feira, agosto 10, 2012

A Tormenta de Espadas: fogo, sangue e magia

Fonte: divulgação.
Um jovem obrigado por juramento a romper com outro, ainda que só por fingimento; uma jovem diante do desafio de atravessar o mundo, arregimentar um exército e ainda vencer os medos que a assolam; um homem assombrado por seu passado, buscando entender suas escolhas e sua própria índole; um garoto com o corpo quebrado e a alma sólida; um homem aleijado e mutilado, numa batalha eterna pela aprovação do próprio pai. Estes são apenas alguns dos elementos marcantes que sedimentam o romance 
Tormenta de Espadas, o terceiro volume da saga Crônicas de Gelo e Fogo.

A situação da guerra se torna cada vez mais séria, com a aproximação do inverno. Como não era para ser diferente, quem mais sofre o povo, enquanto os poderosos jogam seu jogo dos tronos. As fidelidades são testadas, as tradições rompidas e o sangue corre junto com o renascer da magia.

Como no volume anterior, Fúria dos Reis, outros personagens surgem para protagonizar grandes desafios. Brienne de Tarth e Jaime Lannister têm sua jornada própria e a relação atribulada dos dois adiciona uma carga fortemente dramática e ajuda o leitor a ver o Regicida de uma forma mais humanizada.

Enquanto isso, além da Muralha, a Patrulha da Noite terá o primeiro real confronto com os inimigos mais terríveis que já surgiram até agora: os Outros. A sequência desesperadora que se segue ao ataque é de tirar o fôlego. 

Não podemos deixar de falar da herdeira dos Targaryen. De longe a odisseia de Daenirys é mais fascinante que todas as demais narrativas. Quanto maiores seus dragões ficam, mais poderosa parece a personalidade de Danny. Ressalto, porém, que essa força está em suas decisões e força de caráter. Os dragões, embora importantes para afirmar o poderio e prestígio da jovem, são meros coadjuvantes diante dessa menina que já nasceu Dragão. E com o surgimento dos dragões, a magia começa a brotar por toda Westeros, como havia sido falado no livro anterior. Já neste volume, as maravilhas se tornam ainda maiores, embora completamente factíveis, uma vez que a saga de George R.R. Martin tem um compromisso quase radical com o realismo.

Com sequências de incrível carga dramática, batalhas épicas e desafios notáveis, Tormenta de Espadas certamente será um livro difícil de largar.


Ficha Técnica
Título: A Tormenta de Espadas
Autor: George R.R. Martin
Edição: 1
Editora: LeYa Brasil
ISBN: 9788580442625
Ano: 2011
Páginas: 884
Tradutor: Jorge Candeias

Página do livro no Skoob: http://www.skoob.com.br/livro/150936

quarta-feira, agosto 08, 2012

Um Mundo em meus braços

Algazarra. Vozes infantis se alternam, enchem o ambiente. É como uma melodia improvisada para me recepcionar. Os sorrisos brilham através dos olhos infantis. Sorrisos que esbanjam venturosa inocência.

Sou visita, mas é como se fosse de casa. Ali, o que dita a regra é o pertencimento, o afeto. Meus braços são levados ao limite; as três crianças querem colo, embalo, atenção. Meu nome é gritado e repetido por vozes que não cessam enquanto não forem atendidas. Minha alegria é temperada pelo desafio que beira o desespero. Se pudesse, embarcaria o mundo todo com estes braços. Três mundos inteiros, particulares, que passeiam entre a agitação vulcânica e a paz idílica.

As brincadeiras são interrompidas quando o dono da casa chega, trazendo o lanche. Momentos de oração, de compartilhamento. O alimento passa de mão em mão, como naquela antiga Ceia. Uns cuidam dos outros, servindo o pão, o café quente e forte, o achocolatado.

Barrigas cheias fornecem a energia para uma segunda rodada de algazarra. Pezinhos tão pequenos dançam, sapateiam, enquanto as mãos se erguem, criando coreografias repletas da graça infantil.

Subitamente, o dono da casa decreta: hora de dormir. Ordem dada não é necessariamente ordem cumprida. Até dormir se torna brincadeira para os três pequenos, que deitados resistem ao sono com risos e cochichos. Não param um momento sequer. A cama é pequena para os três e eles usam o espaço limitado para continuar a bagunça.

Tomo nos braços a menor deles, um toquinho que ainda não fez dois anos. Ela como que imediatamente se aquieta, enquanto conversamos de um jeito só nosso.Ela mostra para mim toda a sua curiosidade, repetindo com diligência os nomes dos objetos à nossa frente à medida que eu os pronuncio. Sinto meu peito tremer de ternura e gratidão por participar dessa singela exploração, nós dois tateando o espaço através das palavras. Vasculhamos o céu, conhecendo as estrelas. Ela diz de repente que a lua não veio, ninguém "a trouxe".

Começo a cantar para ela. Embalada pelo som de minha voz, ela adormece. E meus olhos se umedecem ao vislumbrar aquele pedacinho de gente, um mundo inteiro traduzido num nome. Naquele instante, um mundo adormece em meus braços.

segunda-feira, agosto 06, 2012

Frutos da estação - III

Moulin de la Galette (1886), Vincent Van Gogh





Esquinas do tempo
estabelecem austeros
moinhos de vento









Haikai produzido durante a atividade Estação da Poesia, realizada por Simone Teodoro.


Aproveito para compartilhar com vocês outros frutos: Há quase 1 ano comecei a publicar aqui a novela A Cidade Suspensa. Não imaginava, mas essa aventura rendeu novos leitores e muitos momentos de conversa calorosa. Pude firmar incríveis amizades e aumentar a confiança no que escrevo. Tudo isso graças aos leitores.

Assim, tive coragem e ousadia para enviar meu texto para a Editora Andross e vi acontecer: um livro onde meu texto estava escrito.

Agora, vejo outra realização. O resultado do Concurso Nacional de Mini Contos da Sul Info Publicações, onde tive outro texto selecionado. Como prêmio, receberei cinco exemplares e um certificado. 

Compartilho com todos aqueles que acompanham minhas peripécias de escritor aprendiz esses momentos de alegria. E quero convidá-los a celebrar comigo no dia 14 de agosto, aqui mesmo. Basta entrar no link para A Cidade Suspensa e deixar lá seu comentário. A intenção é fazer uma grande festa virtual. 

Tinha pensado em fazer também outro tipo de comemoração, mas temia ser injusto com meus amigos de outros estados, que não pudessem estar aqui comigo. A vontade mesmo era de abrir algumas garrafas de vinho com todos vocês!

Deixo então registrado aqui todo o meu carinho, em retorno a tantos comentários positivos, a tanto incentivo. Vocês são demais!

sexta-feira, agosto 03, 2012

Do amor e outros demônios

Ao terminar a leitura de Do amor e outros demônios, de Gabriel Garcia Márquez, fui assaltado por uma mistura de sentimentos que dançavam entre a ternura e a melancolia. Percebi que a genialidade de Garcia Márquez já se mostrava na intensa sinergia entre o título do livro e a forma como a história é narrada. Digo isso porque toda a ternura que perpassa o texto é contraposta à crueza maligna perpetrada por personagens compromissados em fazer funcionar um sistema cruel e alienador.

A narrativa ocorre ainda no período colonial e conta a história do amor entre Sierva María de Todos los Angeles, uma menina de 12 anos, filha de um marquês decadente, e Cayetano Delaura, padre esclarecido e ligado à Inquisição. 

Sierva María, vítima da mordida de um cachorro contaminado pela raiva, fora criada em meio aos escravos de sua casa, sendo versada em 3 idiomas africanos, além de conhecer suas divindades e rituais.

Seus pais, destroçados pelo tempo e pela fatalidade, são incompetentes em fazê-la feliz. Essa missão cabe aos escravos com quem Sierva María convive, e que a adotam com muito prazer. A menina cresce em meio a tradições que supostamente não lhe pertencem e dessas tradições constrói sua identidade.

Quando o perigo da raiva se transforma em suspeita de possessão demoníaca, Sierva María é enviada para o Convento de Santa Clara, para a ala das "enterradas vivas". Seu pai, o marquês de nome Ygnácio, ainda tentara em vão resgatar a alma de sua filha e talvez também sua própria. Com o fracasso de seus esforços, ele é obrigado a abandoná-la por ordem do bispo da colônia.

Cayetano então é destacado pelo bispo, como seu homem de confiança, para exorcizar a menina. O padre calado e estudioso não imaginava que ele mesmo seria vítima dos mesmos demônios que atormentam Sierva María. E o maior desses demônios é o amor.

Deixo aqui um trecho do livro, para que todos possam perceber a beleza presente nas palavras de Garcia Márquez:

Mais uma vez insistiu que o prognóstico não era alarmante. A ferida estava longe da área de maior risco, e ninguém lembrava que tivesse sangrado. O mais provável era que Sierva María não contraísse raiva.

- E enquanto isso? - perguntou o Marquês.
- Enquanto isso - disse Abrenuncio -, toquem música, encham a casa de flores, façam cantar os passarinhos, levem-na para ver o pôr-do-sol no mar, dêem-lhe tudo o que possa fazê-la feliz. - Despediu-se rodando o chapéu no ar e com a frase latina de rigor. Mas dessa vez traduziu-a em homenagem ao Marquês: - "Não há remédio que cure o que a felicidade não cura."

Escrito com um um ritmo cadenciado e repleto de imagens poéticas, Do amor e outros demônios é uma leitura forte, pungente e, sobretudo, sublime.

Ficha Técnica
Título: Do amor e outros demônios
Autor: Gabriel Garcia Márquez
Editora: Record
ISBN: 8501042285
Ano: 1995
Páginas: 224
Tradutor: Moacyr Werneck de Castro

Página do livro no Skoob: http://www.skoob.com.br/livro/474

quarta-feira, agosto 01, 2012

Mario Cau na Gibiteca

Já contei aqui que trabalho em uma biblioteca, sempre cercado por livros, buscando a aproximação de textos e leitores. 
Não havia contado, creio, que dentro da biblioteca há uma gibiteca.
Sim, temos um acervo enorme de quadrinhos, que variam de gibis a graphic novels, álbuns e mangás. Os temas são tão variados quanto as publicações.
No espaço da gibiteca acontecem atividades periódicas, como o Leituras em Quadrinhos e o Conversa em Quadrinhos. O primeiro é um clube de leitura bem informal e o segundo é um momento especial para conhecermos os quadrinistas que estão fazendo a diferença no cenário nacional (e internacional) das histórias em quadrinhos.
Neste sábado, tivemos mais uma edição do Conversa em Quadrinhos e recebemos o Mario Cau, que mostrou muito de si mesmo através de suas palavras, como já faz com seus desenhos. Ele falou de sonhos, expectativas e experiência profissional. Arrancou gargalhadas de todo mundo e do seu jeito bem simples tornou a conversa ainda mais descontraída. Foi um sábado memorável, não duvido disso.
Para quem ainda não conhece o trabalho do Mario, basta acessar o site Petisco, pelo link http://petisco.org/terapia/, webcomic vencedora do HQMIX 2012.