sexta-feira, junho 16, 2023

A Carta Que Ninguém Vai Ler 4

Quero romper o esquife. Quero buscar as alturas. Crescer, tornar-me pleno, galgar os ares. Estou como morto, mas revivo. Renasço. Ou, pelo menos esta é minha vontade. Tornar-me criatura alada. Sublimar a dor e renascer.

Sinto em minha boca o sabor do pó da terra. Estou no chão, nu e ferido. Quase morto. Sofri o peso das minhas ambições, mas não deixo de ambicionar. Meu desejo é forte. Não é desejo de um morto. Não é o desejo de um falido. Se fracassei, quero tentar outra vez.

O horizonte adiante é vasto. Ainda que eu esteja junto ao chão, sinto uma enorme ânsia de voo. E isso se reflete em meus braços, estendidos como asas, e meus pés, firmes como colunas. Sim, eu me levantei e quero dar passos de gigante. Quero alcançar tudo. Conhecer todas as coisas e girar o mundo sob meus pés.

Agonia é algo passado. Sou uma nova pessoa. A pessoa metamorfoseada. Repito em mim o ímpeto de continuar tentando. Por eras estive preso ao chão, encerrado em algo que antes era esquife, envolvido por algo que já foi mortalha. Agora, porém, transformo em casulo o que antes me prendia. Casulo a ser rompido com novas forças que alcanço com essa determinação.

Estou desperto, vivo, pronto. Uma fina película envolve meus braços. Uso-a como asa para subir aos ares. Com o casulo rompido, saio como novo e desperto, preparo-me para voar. De braços abertos eu me entrego aos raios da Aurora.