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sexta-feira, maio 07, 2021

Finalmente, o leite - A história da história num mirabolante jogo


Ninguém pode negar a inventividade do escritor britânico Neil Gaiman. Famoso pela obra em quadrinhos Sandman, que repaginou um herói esquecido, Gaiman há muito tempo já escrevia, sendo um autor premiado de diversos contos, bem como de romances aclamados, como Os Filhos de AnansiDeuses Americanos e Coraline, entre muitos outros.

Quando Finalmente, o leite caiu em minhas mãos, fiquei muito animado para ler. Afinal, sou admirador dos trabalhos de Gaiman, em especial sua obra literária. Sendo assim, quando a Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de BH recebeu um exemplar doado pela Letícia Pimenta, criadora do Clube do Livro BH, fiquei muito animado para ler.

Confesso que é de longe o menos interessante que eu li, de todos o de Gaiman. O pai "inventa" uma  história mirabolante e nonsense para justificar a demora em retornar do mercado para os filhos (uma menina e um menino) colocarem no cereal durante o café da manhã.

Existem duas grandes piadas no livro. A primeira é sobre o tempo, havendo paradoxos temporais e viagens no tempo que os provocam. A segunda(que deveria ter sido a primeira) é a metanarrativa. O livro tem um primeiro narrador (o filho), que escuta do pai a aventura. Sendo assim, estamos lendo a narrativa da narrativa, com o acréscimo da interlocução da irmã, que faz brevíssimos comentários ao longo do desenrolar da história.

Dessa forma, o livro é um enorme faz-de-conta, ao mesmo tempo que é um conta-e-faz, em um emaranhado de ideias mirabolantemente ridículas de um pai meio picareta que só sai para comprar o leite dos filhos porque de fato ele quer um pouco dele para o seu chá. O livro conta com piratas, dinossauros, alienígenas, além de outros perigos. Todos esses perigos sendo um prato cheio para crianças.

Com muito humor e doses cavalares de falta de noção, Finalmente, o leite é mais uma das provas da enorme - e ao que parece - inesgotável criatividade de Neil Gaiman. Além de ser uma excelente dica para crianças interessadas em tudo que uma criança pode se interessar. E um pouquinho mais.


Ficha Técnica

Felizmente, o Leite

Neil Gaiman

Desenhos de Skottie Young

ISBN-13: 9788579802591

ISBN-10: 8579802598

Ano: 2016 

Páginas: 128

Idioma: português

Editora: Rocco Jovens Leitores

Perfil do livro no Skoob: 

quarta-feira, abril 07, 2021

Distopia sanitária II


Jair Carluxo estava exausto. Ao começar aquela semana, o inspetor de polícia nunca imaginaria que teria um caso daqueles em suas mãos. Talvez ninguém imaginaria. Afinal, vinte anos depois do Grande Expurgo dos Assintomáticos, era a primeira vez que um homicídio culposo por covid acontecia.

O inspetor Jair Carluxo Bolsominion Rodrigues foi chamado à sala do Superintendente no início da semana. Com tantos anos de trabalho, imaginou que não deveria ser algo importante. Talvez mais um convite para se filiar ao Partido da Fé em Cristo, ou para a Associação de Bolsonaristas Históricos. Foi com grande surpresa quando descobriu que tinha em seu colo um Inquérito de Óbito Sanitário. E pior ainda foi saber que a causa da morte era Covid-23.

Agora a semana ia pelo meio e o policial estava exasperado por se ver em um beco sem saída. E não era para menos. Ninguém falava de assintomáticos desde o Grande Expurgo. E com a tecnologia de rastreamento genético, qualquer óbito causado por agente aéreo transmissível poderia identificar o transmissor. 

O grande problema, porém, era que o DNA coletado não estava presente no banco de registro de assintomáticos. Com tantos postos de controle, era impossível que alguém com sintomas andasse livremente pela cidade. Ou então o assintomático teve seu registro apagado deliberadamente. 

Jair Carluxo suspirou. Precisava de respostas e com urgência. Dois ou três influencers já pressionavam a Secretaria de Segurança Semipública para noticiar aquela morte. E o superintendente continuava a insistir que precisava tuitar o nome do suspeito até sexta-feira, mesmo que tivesse que apagar depois.

O inspetor de polícia ignorava, mas já havia cruzado com o assintomático no meio daquela mesma semana. E assim como a vítima daquele caso, Jair Carluxo logo estaria morto.

sexta-feira, fevereiro 05, 2021

O guia do mochileiro das galáxias - humor e criatividade na dose de uma dinamite pangalática


NÃO ENTRE EM PÂNICO. Acredito que essa frase é muito útil em inúmeras situações. Seja em momentos em que a gente descobre que perdeu as chaves de casa em uma sexta-feira depois daquela saideira do bar. Ou então ao descobrir que não viu aquele e-mail do chefe, enviado uma semana antes, mandando fazer aquela tarefa "pra ontem". Ou até mesmo em casos de inevitável demolição de um planeta para a construção de uma via expressa hiperespacial.

Essa é a frase de ordem estampada na capa do mais famoso e prestigiado guia de viagens do universo, O guia do mochileiro das galáxias. Não é por nada que ele também empresta o nome a um dos livros mais inventivos de nossos tempos. Escrito por Douglas Adams, o livro dá início a uma saga de cinco volumes narrando as desventurosas aventuras do inglês Arthur Dent, seu "parça" Ford Prefect, o mais humano dos alienígenas, dentre outras excêntricas personagens. Uma delas é Marvin, o robô maníaco-depressivo. Outra é Tricia Mcmillan, ou Trillian, a ousada astrofísica e companheira Zaphod Beeblebrox, um bon vivant totalmente caótico que, após alcançar o cargo de presidente da galáxia, orquestra um dos maiores roubos da história do universo.

Com tudo o que já foi dito, é possível ter uma leve ideia do que encontrar em O guia do mochileiro das galáxias. Antes de tudo, trata-se de uma narrativa repleta daquele humor crítico em que o mundo da ficção científica funciona como uma alegoria da contemporaneidade. Douglas Adams utiliza-se de conceitos complexos da astrofísica, da filosofia e até mesmo da literatura para tecer suas refinadas e deliciosas críticas.

Outro ponto interessante na narrativa é que Arthur Dent, improvável protagonista, surge para negar a jornada do herói. Como uma espécie de "Ulisses de araque", ele passa a maior parte do tempo sem fazer a mínima ideia do que está acontecendo. Claro, sua reação poderia ser proveniente do choque de ter o seu planeta natal transformado em vapor. Porém, muitos anos-luz serão percorridos até que o impossível herói dessa saga espacial terá o mínimo de noção do que está acontecendo e qual o seu papel no universo.

Não é preciso falar muito para atestar a maestria de Douglas Adams ao conceber sua "Odisseia Galáctica". O trabalho magnífico desse grande escritor é mundialmente conhecido. Porém, é sempre bom reafirmar a importância de um clássico como esse. Afinal, nele está contido um dos maiores mandamentos do Universo: NÃO ENTRE EM PÂNICO.


Ficha Técnica

O guia do mochileiro das galáxias

Douglas Adams

ISBN: 9788599296943

Editora: Sextante

Ano: 2010

Páginas: 156


Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/o-guia-do-mochileiro-das-galaxias-225ed344547.html

sexta-feira, fevereiro 16, 2018

Altered Carbon: o ser para além do humano

Quais são os limites para o que se pode considerar humano? Quando uma consciência tem a capacidade de mudar de corpos, ultrapassando limites de idade, gênero, etnia, a partir de quais critérios tal consciência poderá construir sua identidade e se considerar humana? 
Essas e outras questões são lançadas ao aturdido espectador enquanto este assiste a mais recente série da Netflix, Altered Carbon.
Baseada no livro homônimo de Richard Morgan, a série já de início apresenta o conceito de "capa": a partir de um chip  ou cartucho implantado na base da nuca, a consciência pode ser capturada e transferida para outro corpo. Dessa maneira, o corpo passa a ser nada mais que uma capa, ou roupagem, da qual a consciência pode se servir da maneira que quiser, desde que tenha dinheiro para tanto. Além disso, a morte foi superada. Afinal, se o chip ou cartucho não for destruído, a consciência pode ser implantada em outro corpo e seguir sua vida normalmente.
Porém, como assinalado acima, apenas aqueles que dispõem de dinheiro podem fazer uso de corpos conforme seus gostos e caprichos. Apenas aqueles com grande riqueza podem usufruir da imortalidade.
Em um mundo assim o espectador conhece Takeshi Kovacs. Ele é o último emissário, um antigo rebelde com treinamento de combate altamente qualificado. Acordado de uma prisão criogênica de 250 anos, ele é contratado por um magnata para resolver um assassinato. E a vítima é o próprio magnata. Todas as pistas indicam o suicídio, mas ele é um matusa, um dos mais antigos, e sua honra não admite algo como o suicídio.
Kovacs recebe a oferta de uma fortuna, além do perdão de seus crimes, para aceitar o caso. Assim, tem início uma intrincada trama envolvendo sexo, intrigas, política e uma boa dose de ação.
Minha impressão da série como um todo foi muito boa. Senti que mergulhava em um rico universo em que o espírito se torna a matéria. Afinal, a consciência, nessa ficção, consiste em um cartucho eletrônico. Assim, é interessante observar como valores morais e questões filosóficas vão se desenvolvendo em torno do enredo, enquanto Takeshi Kovacs, assombrado por seu passado, faz o melhor estilo anti-herói, e mergulha em um ambiente noir, com direito a referências diretas ao pai do romance policial, o próprio Edgar Allan Poe.
As personagens são interessantes e carismáticas. Elas vão ganhando profundidade ao longo dos episódios. Com exceção de Kovacs, que faz um percurso moral de redenção, alcançando o patamar de herói e encontrando o seu nêmesis. Esse percurso empalidece a carga dramática em redor do protagonista.
Das personagens que crescem ao longo da série, merece destaque a policial Kristen Ortega. Incorruptível e durona, Ortega segue os passos de Kovacs por seus próprios interesses e não tem medo de enfrentar quem quer que seja. Seus rompantes de fúria se fazem no melhor espanhol chulo.
Existem outros pontos interessantes a se observar. Por exemplo, a sociedade que se descortina na série. Ainda que séculos tenham se passado desde a "descoberta" da imortalidade, com a raça humana tendo colonizado inúmeros planetas e se expandido para muito além dos seus limites, pareceu-me que eu estava diante da mesma sociedade do século XXI. Outras distopias, como Admirável mundo novo e 1984, apresentam uma "evolução" na sociedade de forma mais marcante que Altered Carbon.
Com isso, arrisco dizer que esta série não deixa de ser uma aguda crítica de nosso tempo, onde imagens superficiais e repletas de artificialidade, como perfis de mídias sociais, constroem relações muitas vezes perversas e predatórias, aumentando ainda mais as desigualdades em nossa sociedade, cada vez mais desigual.

Ficha técnica
Altered Carbon
Criação de Laeta Kalogridi
Produção: Netflix
Baseado no romance de Richard K. Morgan.
Site oficial.

domingo, março 26, 2017

Trilogia da Fundação - Um surpreendente mergulho em nosso possível futuro

Não costumo fazer resenhas de trilogias ou séries literárias, mas de obras individuais, principalmente por não ter a intenção de ser um blog analítico, nem de crítica acadêmica. Além disso, uma resenha conjunta, a meu ver, não é tão legal. Acho que cada obra tem sua especificidade, como se fosse um indivíduo único.
Assim, foi com certa relutância que decidi escrever esta resenha. Porém, como faz um tempo que não publico alguma, e como só publiquei uma este ano, resolvi juntar esses motivos para fazer um três em um.
Tudo bem que talvez seja muita pretensão de minha parte fazer comentários sobre um dos trabalhos mais impressionantes do Guru da ficção científica, Isaac Asimov. Mas é assim mesmo que a gente aprende.
A trilogia começa com o livro Fundação mostrando - com o perdão do trocadilho - os fundamentos dessa saga cósmica. Um jovem matemático é convidado a trabalhar na Universidade de Trantor, capital do Império Galáctico, a milhares de anos em nosso futuro. Lá ele conhece Hari Seldon, o fundador de uma estranha ciência chamada Psico-História. Segundo esta, seria possível prever o futuro de uma civilização através de fórmulas matemáticas. Sendo assim, foi previsto o declínio do Império e sua inevitável queda, seguida de trinta mil anos de barbárie.
Para atenuar os efeitos dessa crise e encurtar esses trinta mil anos em apenas mil, Seldon cria uma fundação de cientistas que deveriam tratar de todo o conhecimento do Império e guardá-lo em uma inédita enciclopédia, para quando um novo império surgisse.
A princípio, este é o objetivo da Fundação, estabelecida no planeta Terminus, na periferia mais obscura e distante da galáxia. Há, porém, um objetivo oculto e impressionante, que será revelado gradativamente, à medida que o Império se degenera e a periferia se torna cada vez mais instável e perigosa, com o surgimento de governos planetários belicistas.
Sei que a importância de uma obra pode interferir em sua leitura, de forma a causar uma expectativa que pode ser frustrante. Não foi esse o caso. O texto de Asimov é equilibrado e fluido, muito agradável. Além disso, seus personagens são cativantes, embora o tempo que o leitor passe com eles seja relativamente curto. Afinal, a trilogia cobre um período de mais de trezentos anos em que crises e reviravoltas acontecem.
É importante destacar, também, como Asimov tem uma incrível visão estratégica, dando ao leitor a impressão de que ele está fazendo um zoom sobre um indivíduo específico, depois de um espetacular panorama.
É interessante observar certos anacronismos. Afinal, Asimov não é um profeta, a ponto de prever as mudanças sociais que ocorreriam nas três últimas décadas. É possível notar também certo sexismo no desenrolar da trama, tendo as mulheres pouca participação no enredo. Além disso, talvez ele não imaginasse que a tecnologia nuclear seria descontinuada. Mas como eu disse, Asimov não é mágico, mas um ficcionista, e ele fez algo impressionante em sua "ópera espacial", com direito a devaneios sobre possíveis habilidades futuras em uma sociedade humana que buscasse evoluir em consciência e linguagem, nas ciências humanas, ao invés das exatas.
Com um enredo fascinante, um universo rico e complexo e o talento de um exímio prosador, Asimov faz da sua trilogia Fundação, Fundação e Império, Segunda Fundação uma jornada inesquecível para o leitor.


Ficha Técnica
1. Fundação
Páginas: 239
2. Fundação e Império
Páginas: 248
3. Segunda Fundação
Páginas: 235
Autor: Isaac Asimov
Editora: Aleph

Perfis dos livros no Skoob:
1. https://www.skoob.com.br/livro/2668ED3474
2. https://www.skoob.com.br/fundacao-e-imperio-27768ed30170.html
3. https://www.skoob.com.br/segunda-fundacao-27769ed30172.html

sexta-feira, maio 29, 2015

Rio 2054: sobre um futuro que se quer esquecer

Há muito li Rio 2054, de Jorge Lourenço, e me cobrava uma resenha. Fui agraciado por um exemplar do livro em uma promoção feita pelo próprio autor. Recebi um duplo presente.
Sim, afirmo que foi duplo. Além do livro, fui brindado com uma narrativa equilibrada, enxuta, vívida e ligeira. O narrador criado por Lourenço é econômico sem cair no minimalismo. Seus cenários são facilmente visualizados pelo leitor: um mundo decadente, onde a distância entre ricos e pobres torna-se quase surreal. Uma distopia repleta de elementos tecnológicos verossímeis. 
Outro ponto muito bacana são os personagens, com destaque em Miguel, o protagonista, que assume a posição de anti-herói, alguém que vive à margem dessa sociedade mas que lentamente percebe estar no olho de uma tempestade que irá sacudir seus fundamentos.
Para deixar mais forte o suspense, tentei ser o mais econômico possível em relação ao enredo desse ótimo livro. Destaco apenas que um dos pontos fortes é a ação quase vertiginosa, alucinada. Além disso, os chamados geeks e demais amantes da cultura pop irão reconhecer diversas referências a clássicos do gênero, desde mangás/animes até obras literárias e cinematográficas.
Imerso em um vívido universo ciberpunk, Rio 2054 certamente é uma das melhores narrativas futuristas escritas em solo brasileiro. Uma obra quase premonitória sobre um futuro que deveria ser esquecido.

Ficha Técnica:

Rio 2054
Os filhos da revolução
ISBN-13: 9788576798644
ISBN-10: 8576798646
Ano: 2013
Páginas: 374
Editora: Novo Século

quarta-feira, agosto 06, 2014

Portais: mundos imersos em mundos

Conheci o Ledinilson, autor de Portais, há uns bons dez anos. Na época, eu trabalhava como programador, assim como ele. Nenhum dos dois imaginava que tanto tempo depois, quando já não tínhamos mais contato, seríamos novamente companheiros de trabalho, só que agora no mundo das letras.
Foi assim que pude também ler Portais, uma trama fantástica com toques de ficção científica. No livro, quatro amigos que estudam na Faculdade de Engenharia da UFOP se veem subitamente envolvidos em uma trama internacional, ao descobrirem que suas linhagens estão ligadas a poderosos clãs destinados a guardar as chaves dos portais: artefatos que podem criar aberturas no espaço-tempo, levando a dimensões onde não apenas a física é diferente, mas onde as ideias chegam a ter forma. Através desses portais seria então possível ter contato com qualquer objeto que tenha sido alguma vez concebido. 
Dessa forma, Miguel, Gabriel, Rafael e Mikaela se lançam em uma corrida pela sobrevivência não apenas deles, mas de toda a humanidade.
Repleto de cenas de ação e com boas doses de romance e humor, Portais é uma narrativa que garante bons momentos de diversão.


Ficha técnica
Edição: 2
Editora: Dracaena
ISBN: 9788564469846
Ano: 2012
Páginas: 332