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segunda-feira, maio 05, 2025

Entre livros e amizades em Poços de Caldas

Um relato sobre minha viagem para curtir o Festival Literário Internacional de Poços de Caldas


Um registro da minha câmera maravilhosa. 


Enquanto escrevo, o ônibus balança um pouco, fazendo trepidar a tela do aparelho celular em minhas mãos. Estou retornando para Belo Horizonte. Saí de Poços de Caldas no início da tarde. Estive na cidade para curtir mais uma edição do Festival Literário Internacional Poços de Caldas - Flipoços. Estive nos dias 1 a 3 de maio assistindo a debates, passeando entre livros e revendo amizades. Além de ter feito novos contatos. 

Quando cheguei já era noite do dia primeiro. Com isso, visitei a feira sem participar da programação. Saí do Lux Hotel, onde estava hospedado, e fui caminhando até o Parque José Affonso Junqueira, onde o evento estava montado.

Já de início fiz contato com a escritora Bianca Pontes, colega no Clube de Escritores BH. Combinamos de nos encontrar já na feira. Também contatei a Mírian Freitas, que estava em companhia do Pedro Gontijo e da Gilberta Kis.

Era uma profusão de acontecimentos. A programação ainda acontecia. Um fluxo intenso de pessoas transitava pelas barracas e também pela chocolateria Lascaux, famosa por seus chocolates artesanais, inspirados em minerais da região. Encontrei a Gil e a Mírian no corredor de acesso do Lascaux Fomos até a entrada da feira e eu avisei que tinha uma outra amiga no evento. Fui em sua busca.

Ao encontrar a Bianca, ela me apresentou a escritora Cibele Laurentino. Tratei de apresentá-las às outras duas amigas. Logo chegou o Pedro Gontijo e nos juntamos como um grupo. Saímos juntos, trocamos ideias, reflexões e opiniões literárias e sobre a vida também. Nessa primeira noite em Poços de Caldas, atravessamos o centro da cidade, saindo do local da vila literária e indo até uma pizzaria chamada Caos, pertinho do meu hotel. 

No segundo dia, vasculhei um pouco a feira. Procurei a tenda do movimento Neomarginal, em especial a pessoa do Wesley Barbosa. Conversei um pouco com ele, explicando que trabalho em biblioteca pública e estou em contato com coletivos literários da periferia da Grande BH. Comprei dois livros dele e o cumprimentei pelo trabalho. Eu havia ficado sabendo do trabalho literário do Wesley a partir de um episódio lamentável ocorrido no evento, sobre o qual prefiro não entrar em detalhes. A mídia nacional cobriu amplamente o acontecido. Por isso, estaria só repetindo o que todo mundo já sabe. Apesar desse episódio execrável, pude por meio dele conhecer o trabalho do Wesley, que tem uma editora chamada Barraco Editorial. Os livros do Wesley que adquiri foram “Viela ensanguentada” e “O diabo na mesa dos fundos”.


Com o escritor Wesley Barbosa. 


Almocei com Bianca e Cibele. Na saída, adquiri o livro “Nobelina”, da Cibele. Depois do almoço, nos separamos para uma passada no hotel. Mais tarde, nos reunimos para assistir à mesa “Gaza: A Tragédia Silenciada – Reflexões sobre o Genocídio e suas Vozes”, que contou com a presença da Mírian Freitas, além da Soraya Misleh, Jornalista palestino-brasileira, Salem H. Nasser, professor da FGV e estudioso do Oriente Médio, do mundo Árabe e Mulçumano e a Laura Di Pietro, co-fundadora da editora Tabla. Quem mediou a mesa foi o Pedro Gontijo, que é escritor e jornalista. 

A mesa foi forte, urgente, com falas contundentes e necessárias, denunciando o genocídio em curso promovido pelo Estado de Israel contra o povo palestino. Uma atrocidade sem tamanho, em que milhares de crianças foram e continuam sendo assassinadas. A Soraya foi incisiva em sua fala, com uma revolta quase explosiva, conclamando todas as pessoas a lutarem em prol da causa palestina. Ela falou da colonização por ocupação, que visa substituir a população nativa por uma outra, de fora, e que o plano sionista não é novo, assim como os massacres de Israel contra aldeias palestinas.

O professor Nasser teve uma fala reflexiva sobre os disparates do silenciamento das narrativas palestinas e imposição de uma história única, elaborada como propaganda para colocar toda a comunidade mundial contra o povo palestino. 

A Laura abordou a riqueza da literatura produzida por palestinos. Não apenas como relato documental, algo importante para o registro histórico do que está ocorrendo, mas também como resistência e principalmente como sobrevivência da cultura palestina.

Mírian então fez sua fala a partir da experiência de escrita e publicação de seu livro “Damascos Feridos – poemas sobre Gaza”. Uma obra poética que atua como um grito de dor e protesto, nascido da empatia pelo sofrimento das mães, suas crianças e demais pessoas da Palestina.

A mediação do Pedro foi brilhante. Equilibrada, incisiva e reflexiva, procurou explorar o que havia de fundamental nas falas das convidadas e do convidado.

Dessa mesa, dois pontos eu gostaria de destacar: um é a palavra “Sumud”, que é rica em significados, uma palara-semente, que encerra em si a resistência e a esperança do povo palestino. A segunda é a frase da Soraya: “Somos todos palestinos.” Enquanto não percebermos a dimensão dessa frase, continuaremos inertes diante da escalada do terror que ocorre na Palestina.


Mesa sobre o Genocídio em Gaza.


Depois dessa mesa tão potente, precisei retornar ao hotel para descansar um pouco, pois foi uma mesa que mexeu muito com a gente. Retornei mais tarde para encontrar os amigos, que estavam em um bar na companhia da Laura e da Ana, ambas da editora Tabla. Conversamos bastante sobre literatura. 

Mais tarde, depois que Ana e Laura haviam ido embora, saímos do bar e fomos caminhando ao longo das bordas do parque, até encontrarmos um quiosque que vendia pizzas e massas, chamado Picolin. De lá, ainda passamos em uma loja de conveniência, onde compramos picolés e nos despedimos com muita alegria.


A galera reunida.


No dia seguinte, 3 de maio, cheguei a tempo de pegar a mesa “Prêmios Literários: Reconhecimento, Impacto e o Futuro da Literatura Brasileira” com a presença da autora Izabella Cristo e mediação do Henrique Rodrigues, curador do Prêmio Caminhos da Literatura. Izabella venceu o 1º. Prêmio Caminhos da Literatura e estava lançando o livro “Mãezinha”, pela Editora Dublinense. Durante a mesa, ela falou sobre a experiência da escrita do livro, que passa pela vivência da maternidade da UTI e também do exercício da profissão de médica cirurgiã.

Aproveitei para perguntar sobre a importância da cadeia de mediação para o fortalecimento da literatura. Henrique respondeu que é fundamental profissionalizar a mediação, inclusive criando leis que estruturem a mediação como política pública, atrelada à compra de livros, para que não aconteça de o livro acabar parado na estante ou dentro de um armário de uma biblioteca escolar ou pública. 


Com Izabella Cristo. 


Logo em seguida começou a mesa “Literatura e Família – Maternidade, Paternidade e dramas familiares na literatura contemporânea” com Karine Asth, Cibele Laurentino, Guilherme Marchi e Jaqueline Lima. Bianca Pontes foi a mediadora. Com um domínio impecável, ela conduziu tanto o tempo de fala quanto as reflexões, demonstrando um grau enorme de comprometimento com o tema da mesa e com as obras das convidadas e do convidado. Logo de início ela fez uma provocação ao dizer que estava mudando o nome da mesa, trocando “Maternidade” e “Paternidade” por “Parentalidade”, argumentando a partir da fala da Izabella Cristo na mesa anterior, que mãe nem sempre é quem gera e que o ato de criar, educar uma criança, muitas vezes foge do padrão de família convencional. Ela também convidou as pessoas integrantes da mesa a refletirem sobre como essas relações surgem não apenas em suas obras, mas em seus processos de escrita.

Mais uma vez em quis contribuir e, no momento das perguntas do público, perguntei às pessoas da mesa como elas viam a biblioteca pública e se ela ainda é relevante em nossa sociedade atual, em que a informação e a literatura migram cada vez mais para o suporte digital. Todos afirmaram que a biblioteca é fundamental na vida de quem lê e escreve. Karine foi mais longe ao ressaltar que é imprescindível que mães e pais se envolvam no incentivo à leitura, levando suas crianças à biblioteca pública. Ela fez um encantador relato pessoal sobre a visita que fez com seu filho à Biblioteca Pública de Recife. 

Ao final da mesa, aproveitando que tanto a Jaqueline quanto o Guilherme são de Belo Horizonte, falei da Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de BH, convidando-os para conhecerem nosso espaço. Os dois pareceram interessados em visitá-la um dia. Aproveitei para comprar o livro da Cibele “Eu, inútil” e pegar um autógrafo. Em seguida, fui com Bianca, Cibele e Karine a um café que funciona dentro do parque. Porém, logo nos separamos.


Com a Cibele Laurentino. 


Já no início da noite ocorreu a mesa “Territórios da Palavra: A Literatura de Itamar Vieira Junior”. Eu cheguei quando estava começando e ouvi alguém mencionar no alto-falante “O caso da borboleta Atíria”. Meu alarme apitou. Era o Itamar, contando como esse livro foi crucial para que ele se tornasse escritor. Fui conquistado naquele momento, pois me senti conectado ao Itamar. Afinal, esse livro me encantou de tantas maneiras que ele realmente é a razão de eu ter me comprometido com a leitura e a escrita. Comentei isso com o Pedro, que estava do meu lado. Ele riu e disse que com ele foi a mesma coisa. “Foi o primeiro livro da Série Vaga-lume que eu li!” Ele falou. “Somos irmãos de livro!” Declarei, também rindo.

Um pouco mais tarde, ficamos sabendo de uma mesa nascida “de improviso” sobre o Movimento Neomarginal e fomos assistir. No palco estavam o Wesley Barbosa e o Vitor Miranda. Ambos falaram sobre suas trajetórias como escritores. Wesley revelou como encheu o Ferréz de contos e recebeu dele o retorno positivo. Sobre sua escrita refletir sua realidade e sua admiração por contistas clássicos russos.

Autor de “Os ratos vão para o céu?”, Vitor falou sobre a ironia no nome do Movimento Neomarginal, que dialoga com a literatura marginal de 1970. Falou também sobre seu gosto por brincar com leitores e personagens, visando o inusitado. Após a mesa, aconteceu o sarau do Movimento Neomarginal, com participações de autoras e autores com seus textos de prosa e poesia.

Ainda naquela noite, fomos jantar no Ibis. Lá, reencontrei o Henrique Rodrigues. Ele me reconheceu e perguntou se tinha sido eu a fazer a pergunta sobre mediação. Respondi que sim. Conversamos um bocado sobre prêmios literários e políticas públicas para livro e leitura. 

Ainda esticamos um pouco mais a noite, indo parar em uma lanchonete especializada em batatas fritas. Lá, nós falamos sobre experiências com editoras, mercado literário e projetos afins. Dado o avançar da hora, nos despedimos por lá e eu segui a pé para o meu hotel.

Bem, esse foi o fim da aventura na 20ª edição do Festival Literário Internacional de Poços de Caldas - O Flipoços. Dias de encontros inspiradores, nascimento de novas amizades e fortalecimento de parcerias. Acredito que um evento desse porte é extremamente necessário, dada sua potência. O evento também revelou uma necessidade urgente do engajamento no combate ao racismo e a outras várias formas de violência. 

É o terceiro ano seguido que vou a Poços de Caldas em ocasião do festival. Ano passado, fui para expor um dos meus livros na tenda dos autores independentes. Desta vez, porém, estive lá como parte do público e pude curtir mais o festival. Espero que em 2026 eu compareça novamente, fazendo novas amizades e fortalecendo as atuais. Por isso, termino este texto saudando as pessoas da Bianca Pontes, da Cibele Laurentino, da Gil Kis, da Mírian Freitas e do Pedro Gontijo. Muito obrigado por tornarem esta experiência inesquecível.


Gratidão!

sexta-feira, dezembro 29, 2023

Motivador

https://pixabay.com/users/pexels-2286921/



Tela em branco. 

Documento sem nome. 

Vazio de ideias, 

vago em busca de sentido. 

Sozinho. 

Abandonado. 

Sou como o arauto 

de uma era morta. 

Mas não precisa ser assim. 

A tela já não está mais 

em branco. 

Nela repousam palavras 

de angústia 

pelo ciclo que termina 

e o que se inicia. 

Essa agonia 

tão minha companheira 

me pega pela mão. 

A ela me entrego 

e assim escrevo.


Oficina de Prosa Poética - 19/12/2023 

segunda-feira, maio 18, 2020

O que a leitura é para mim?


Muito se pode dizer sobre a leitura. Podemos, por exemplo, assumir um olhar meramente técnico, dizer que a leitura nada mais é que a decodificação de sinais, de forma a atribuir aos mesmos sentido. Ou podemos assumir, como eu, um viés mais amplo.

Não é possível falar de leitura sem pensar em Paulo Freire. O grande educador, em sua obra A importância do ato de ler(1981), fala sobre dois tipos de leitura: a leitura da palavra e a leitura do mundo. E ainda afirma que haveria uma preponderância de uma em relação à outra.

Certa vez, estava sentado em um banco na Estação São Gabriel, aqui de Belo Horizonte, aguardando o ônibus para o bairro Ribeiro de Abreu. Usava uma camisa preta, com a estampa de um mangá pouco conhecido aqui no Brasil - Gantz

De repente, um senhor se aproxima e aponta para o desenho em minha camisa. Ele dá um sorriso de reconhecimento e fala da apreciação do seu filho por desenhos desse tipo. Contou sobre Dragon Ball, dentre outras referências. 

Aquele senhor não conhecia o mangá cuja imagem estava estampada em minha camisa. Porém, observou o padrão da imagem e fez relações que estavam presentes em sua bagagem cultural. Para mim, esse episódio foi um exemplo inesquecível sobre as capacidades de leitura de mundo que as pessoas possuem. E tais capacidades muitas vezes são desprezadas por aquelas pessoas que se consideram "detentoras do saber".

Sei que ao falar de leitura aqui, não estou me referindo à leitura de mundo. Estou falando da leitura da palavra. Porém, para mim, não existe uma sem a outra. Em minha opinião, quanto mais aproximamos mundo e palavra, maior a possibilidade de pertencimento, de associações. Maior a possibilidade do jogo de sentidos.

Chego, porém, ao título deste texto. O que é a leitura para mim? E falo a leitura da palavra. Qual a sua importância em minha vida? A leitura sempre foi para mim uma possibilidade de escape, mas não de escapismo. A leitura ressignifica meus dias e concede a eles um caráter mágico, maravilhoso. A leitura concede sentido à minha existência.

Continuo a buscar a ampliação desse meu conceito de leitura. Tenho para mim que ler é um ato de liberdade e também de existência. Pela leitura eu reafirmo a minha (r)existência, meu lugar no mundo e todas as possibilidades que tal posicionamento me traz. Até quando não leio estou reafirmando a minha leitura, pois tenho nos livros e no texto escrito uma das minhas razões para permanecer neste mundo. Um dos maiores sentidos de meu ser. 

domingo, maio 17, 2020

Vídeo: Pense em quantos anos foram necessários para chegarmos a este ano - Ana Martins Marques



Hoje declamo o poema de Ana Martins Marques presente em "O livro das semelhanças":

Pense em quantos anos foram necessários para chegarmos a este ano
quantas cidades para chegarmos a esta cidade
e quantas mães, todas mortas, até tua mãe
quantas línguas até que a língua fosse esta
e quantos verões até precisamente este verão
este em que nos encontramos neste sítio
exato
à beira de um mar rigorosamente igual
a única coisa que não muda porque muda sempre
quantas tardes e praias vazias foram necessárias para chegarmos ao vazio
desta praia nesta tarde
quantas palavras até esta palavra, esta


Mais histórias e poesias em: http://www.oguardiaodehistorias.com.br/

sexta-feira, maio 08, 2020

Mamãe & Eu & Mamãe - A maternidade reconquistada

Maya Angelou é uma mulher incrível. Digo isso no presente porque, apesar de Maya já ter falecido, sua figura se mantém viva através de seu trabalho artístico, de seu ativismo, da força de suas palavras.
Autora de uma poesia potente e dona de uma mente incansável, Maya foi uma mulher forte e corajosa, uma desbravadora. Sua vida foi inaugurada por tragédias ainda muito cedo. Ainda assim, ela teve A força de superá-las, por intransponíveis que parecessem.

Um dos livros de Maya Angelou que retrata suas superações é Mamãe & Eu & Mamãe. Autobiográfico, o livro fala um pouco sobre essas tragédias, mas se foca principaente no resgate da relação entre mãe e filha e no quanto essa relação foi importante para Maya Angelou como artista, mulher e mãe. 

É interessante observar na narrativa a profunda e incontestável admiração que Maya sempre nutriu pela mãe. Inicialmente, tratava-se de uma admiração distante. Ela conta que sua mãe parecia uma artista de cinema, uma madame. 

O distanciamento se dava também pelo ressentimento. Quando era bem pequena, Maya foi enviada, junto com o irmão, para morar com a avó paterna. Eles só voltariam a morar com a mãe anos depois, quando Maya já estava no final da infância. Essa ausência teria causado em Maya e em seu irmão um distanciamento que parecia impossível de transpor. Tanto que ela não conseguia chamar Vivian de mãe, mas de "Lady".

A distância entre as duas, porém, vai sendo vencida pela franqueza, respeito e, sobretudo, pelo amor. Em nenhum momento, Vivian tentou se desculpar por ter mandado seus filhos para longe. Porém, ela se esforçou ao máximo para estar presente em suas vidas.

Foi impossível não me apaixonar pela pessoa de Vivian Baxter. Uma mulher altiva mas compassiva. Sempre disposta a ajudar, a tratar a filha como igual, sem deixar de oferecer a ela seu regaço de mãe. Repleto de fotos com Maya e Vivian juntas, trata-se de uma obra cálida e terna. Mamãe & Eu & Mamãe é uma homenagem e uma declaração de amor, além da mensagem forte de que com amor e dedicação, as relações de mãe e filha antes distantes entre si podem se transformar em laços impossíveis de serem rompidos. 

Ficha Técnica 
Mamãe & Eu & Mamãe
Maya Angelou
ISBN-13: 9788501114136
ISBN-10: 8501114138
Ano: 2018 
Páginas: 176
Idioma: português
Editora: Rosa dos Tempos

Perfil do livro no Skoob:

domingo, maio 03, 2020

Vídeo: Vandalismo - Augusto dos Anjos



Compartilho este vídeo, que foi gravado há bastante tempo, mas continua atual, assim como o poema que ele performa:




Vandalismo

Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.

Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Vertem lustrais irradiações intensas,
Cintilações de lâmpadas suspensas,
E as ametistas e os florões e as pratas.

Como os velhos Templários medievais,
Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos...

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Quebrei a Imagem dos meus próprios sonhos!


"Eu & outras poesias"
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=1772




Perfil do livro no Skoob: https://www.skoob.com.br/eu-e-outras-poesias-1328ed206177.html

segunda-feira, setembro 30, 2019

Entre duas montanhas

Estive na mediação da última mesa do FLI-BH 2019. Foi uma honra e uma grande responsabilidade.

Ana Maria Gonçalves e Marcelino Feire são gigantes da literatura atual. Estar entre eles fez com que eu me sentisse ainda mais pequeno. Um vale entre duas montanhas.
Evocando o termo "Oralitura", muito pesquisado pela professora Leda Martins, homenageada pelo Festival, Ana Maria falou muito sobre as vozes de sua realidade como uma pessoa filha de mãe negra e pai branco. Contou como a figura da contadora de histórias formou nela a consciência de também ser uma contadora de histórias.

Da mesma forma, Marcelino Feire destacou como sua infância em Pernambuco é de fundamental importância para sua literatura. Marcelino deu um espetáculo ao recitar de memória trechos de seus textos, em especial o conto "Totonha". Relembrando a figura de sua mãe e de uma tia, o escritor assinalou como essas vivências são fundamentais em sua palavra escrita e falada.

Além das vozes, os corpos também foram destacados. Ana Maria Gonçalves apontou o corpo negro como fronteira e a importância da evidência desse corpo, muitas vezes apagado, tratado como invisível. Assim, a escritora defendeu o papel das políticas afirmativas para evidenciar esses corpos como próprios e pertencentes a todos os lugares. O acesso às universidades, antes quase que exclusivas a brancos, seria um exemplo.

Já Marcelino ressaltou como, em sua literatura, é fundamental que a palavra passe por todo o corpo. Ao terminar de escrever, ele passa o novo texto pelo crivo da Leitura em voz alta. Durante a leitura, esse novo texto precisa passar por todo o seu corpo. Ele precisa sentir todo o corpo envolvido. 

Destaco esses dois assuntos, entre tantos abordados. Esses, porém, foram os que mais me impactaram. Os mais frescos em minha memória. Foi um momento de muito aprendizado para mim. E espero continuar aprendendo.

sexta-feira, setembro 20, 2019

FLI-BH 2019 - Do livro à voz: narrativas vivas

A programação do FLI-BH 2019 está no ar. Com a curadoria de Nívea Sabino e Marilda Castanha, o Festival está mais que bonito, está um monumento! Autoras e autores de diversos registros e lugares encontrarão seu espaço no Parque Municipal Américo René Gianneti. Temos Adão Ventura como homenageado. Leda Martins e Ailton Krenak são as menções honrosas.
Sinto que será uma honra para toda e qualquer pessoa que transitar por essa ciranda de Oralitura, que adentrar esse quintalzão que será o Parque Municipal nos dias 25 a 29 de setembro.
Mais que um lugar de escrita, será de escuta. Uma grande roda como aquelas que nossos ancestrais faziam. E nessa grande roda, saudaremos suas vozes com as nossas. Na figura de tantas letras, cantos, performances, slams e saraus, seremos todas uma grande colcha de retalhos.
Não poderia deixar de puxar uma sardinha pro meu lado. Estarei na Biblioteca do FLI-BH com oficinas literárias. Faço também a apresentação "De lobo a bolo". Por fim, terei o privilégio de receber Ana Maria Gonçalves e Marcelino Feire em uma mesa maravilhosa.
A história da Literatura de BH e do mundo ganha mais um capítulo. Um daqueles cheios de reviravoltas, aventuras e muita emoção. E nesse grande épico, estamos todas e todos convidadas. Vem com a gente!

Confira a programação completa no site http://www.fli.pbh.gov.br/.

quarta-feira, julho 17, 2019

Uma noite de afetos, amizade e Pedro Nava

Na noite de 26 de junho, uma quarta-feira, fui visitar o Centro Cultural Padre Eustáquio. Pâmela foi comigo. O evento é mensal e se chama "Feira de Poesia". O tema do evento era a obra de Pedro Nava.

Chegamos atrasados. Como era a nossa primeira vez no evento, ficamos um pouco perdidos. Tanto que erramos a porta e ficamos circundando a entrada da feira coberta do Padre Eustáquio, onde está localizado o Centro Cultural.

Entramos em uma biblioteca em penumbra. Um projetor mostrava imagens da vida do escritor. Ao redor de uma mesa, nós víamos rolinhos com textos de Nava. Apresentando as imagens do autor, estava seu sobrinho-neto, Matheus Nava.

Mergulhamos em um passado repleto de sentimento e perda. Conhecemos um pouco mais das histórias de família, principalmente o pesar da família, e do próprio Pedro Nava, com a morte prematura do sobrinho, José Hyppólito, por quem a família nutria grande admiração.

Ao final da apresentação, fomos convidados a um saboroso café. E pude conversar um pouco com os presentes.

Conheci uma pessoa muito bacana, o Paulo Siuves. Ele esbanjava simpatia e amizade. No bate-papo entrou também o casal de poetas Cirlene Lopes e Geraldo França.

Aproveitei para conhecer o livro de poemas da Márcia Araújo, uma das organizadoras da Feira de Poesia. Não hesitei em garantir o meu exemplar.

Foi uma noite de encontros, novos e antigos. Revi os colegas Hélio e Ângelo. Trocamos algumas palavras, menos do que gostaria. Ficou a promessa de uma outra vez.

Tenho certeza que saí de lá com um tesouro. A vivência do evento e os afetos com as novas amizades enriqueceram minha caminhada.



quarta-feira, junho 26, 2019

Poesia em Turbilhão: Segundo ConVerso de LiteraRua


A Poesia é algo livre. Por vezes, tentamos encerrá-la em formas, mas ela acaba escapando. E o maravilhoso disso é que ela nos puxa para fora de nossa própria gaiola. Nos desconstrói e transforma, fazendo de nós parte dela, num turbilhão de sentidos.

Podemos ver esse fenômeno acontecer quando a Poesia deixa o papel e a tela para habitar as vozes e espaços. Eventos como o Segundo ConVerso de LiteraRua, que procurou celebrar a Poesia, especialmente Marginal.

O ConVerso de LiteraRua foi organizado e produzido pelo Circuito Metropolitano de Saraus.

Compareci ao Usina da Cultura no sábado, dia 15 de junho, às 9h. No centro do salão, cadeiras em roda em frente ao palco, onde algumas pessoas terminavam de fazer os últimos ajustes de som. Cumprimentei o bibliotecário, Diego Dávila, além de outras pessoas da equipe. Andei um pouco pelo espaço, timidamente observando o movimento que crescia.

A primeira roda de conversa, com o tema "Experiência do fazer em espaço público, direito à cidade e ocupação política" contou com a presença de Renato Negrão e Thais Kas. O mediador foi Rogério Coelho, que deu início com uma reflexão ao falar de LiteraTerra.

Negrão e Kas apresentaram suas vivências no fazer cultural e na difusão da poesia marginal. Foi muito interessante ver duas pessoas de perfis tão diferentes, uma da velha guarda e outra da geração mais recente de agitadores poéticos. Em dado momento, Renato passou um livro objeto de sua autoria e assinalou a importância de termos memória, de buscarmos os arquivos ainda vivos da poesia marginal da década de 1990.

Enquanto isso, Thais Kas falou sobre suas referências e os desafios atuais de sua poesia. Além disso, falou de seu amor pela produção, em especial nas ações da Coletiva Manas, da qual faz parte.

Ao final da mesa, o Coletivo Terra Firme se apresentou. Em seguida, fiz um passeio pela feira e já adquiri alguns materiais independentes, zines e marcadores de escritoras que estavam expondo.

Houve então a pausa para o almoço. Aproveitei para escapulir e almoçar em casa. Não participei das atividades da tarde, embora desejasse muito, mas precisava de um descanso. Enquanto eu estava fora, ocorreram as oficinas "Criação de performance poética" pelo Nosso Sarau, de Sarzedo, e "Escrita Criativa-poética" do Sarau Biqueira Cultural, de Ribeirão das Neves.

Cheguei a tempo de pegar o início da segunda roda: "Formação de leitores e público por meio da LiteraRua marginal de Saraus & Slams em diálogo em escolas & Bibliotecas públicas", com Oliver Lucas, Norma De Souza Lopes, Rodrigo Teixeira e Marta Passos. Mediando essa galera estavam Joi Gonçalves e Bim Oyoko.

A fala foi rica e profunda, a partir de diversas visões. A abordagem acadêmica e conceitual de Marta Passos dialogou com a vivência de Norma de Souza Lopes, Oliver Lucas e Rodrigo Teixeira. Este último apresentou uma fala descontraída e repleta de humor, quase como um comediante de stand up. Norma enriqueceu a conversa ao apresentar seu extenso e exaustivo trabalho de mediação de leitura, assim como Oliver também o fez.

Ficou presente com força em minha mente a fala de Marta Passos sobre a política como a contestação da ordem estabelecida. Segundo ela, é o que a poesia marginal faz, sendo ela um dinâmico e transformador fazer político.

Infelizmente, perdi o show da banda Mascucetas, pois precisava ir ao evento "Caldos, Causos e Violas", no Espaço Suricato. Uma festa com sua própria história e que também fala de Arte e Resistência.

No domingo, cheguei cedo para a oficina "Confecção de Zines & Livros" pelo Coletivo Lanternas, de Venda Nova. O mediador, Digô, foi extremamente atencioso e paciente. Fiquei encantado ao ter em mãos dois novos cadernos para serem transformados em histórias e relatos.

No andar de cima da Usina, acontecia a oficina "Edição de vídeo-foto-poesia", pelo Coletivo Avoante, daqui mesmo de BH.

Saímos para o almoço e retornamos para a terceira roda: "Mercado Literário das editoras & feiras independentes, políticas de incentivo à cultura e a profissionalização da literarua marginal". Para discutir a questão, ouvimos Nívea Sabino, Flávia Denise, Jomaka e Walisson Gontijo. Foi uma conversa de desafios e identidades. 

Nívea contestou muito a lógica de uma profissionalização do artista marginal. Inclusive ela defendeu seu profissionalismo, e com muita propriedade. Flávia falou de sua pesquisa e do conceito incerto de "escritor independente". Sua fala me fez refletir, principalmente depois de ter escrito um texto abordando esse assunto. 

Jomaka então fez um poderoso relato de experiência como escritor trans e ativista na luta antimanicomial. Sua experiência é sofrida e angustiante, mas também encorajadora e potente.

A experiência de Walisson Gontijo, na criação da editora Impressões de Minas junto com Elza, foi muito rica e ajudou a vislumbrar um pouco esse cenário de feiras de editoras independentes a partir do olhar de um editor.

Ao final do dia, pudemos assistir a intervenção da Coletiva Manas, com performances de Lelê Cirino, Jéssica Rodrigues, Débora Rosa e Bruxa. Outras poetas se apresentaram quando o microfone foi aberto.

Aconteceram então plenárias para discutir as ações do Circuito. Não fiquei, pois estava exausto. Porém, deixei claro meu interesse em acompanhar os desdobramentos, como amante da poesia falada e dos saraus da Grande BH.

O evento foi potente, para mim. Reencontrei pessoas, conheci novas faces e fiquei encantado com os trabalhos e livros de muita gente que lá estava. Se pudesse, compraria tudo. E também fui impactado com as falas profundas e responsáveis de todas as pessoas envolvidas. Gostaria de saudar o envolvimento de toda a galera do Circuito Metropolitano de Saraus, em espacial de Camila Félix, DuduLuiz Souza e Vito Julião. E para todas as pessoas envolvidas. Foi maravilhoso estar nesse turbilhão poético!








quarta-feira, maio 22, 2019

O escritor independente

Este é um relato sobre um evento antigo que me marcou profundamente.

Vou falar aqui sobre o encontro que ocorreu no sábado, dia 7 de fevereiro de 2015, na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte. Estiveram presentes seis pessoas que debateram o tema: "O Escritor Independente". Era um grupo heterogêneo. Havia pessoas no início de suas carreiras, bem como escritores já bastante experientes.

Para nortear as discussões, perguntei: quais são os desafios do escritor independente?
Divulgação? Distribuição? Dinheiro? Percebemos que por maiores que sejam esses desafios, eles vão se mostrar diferentes para cada pessoa. O perfil de cada escritora ou escritor é único, assim como a leitura que cada pessoa faz, sua vivência e percurso literário.

Assim, veio a mim a pergunta: O escritor precisa de um agente? José Carlos Aragão, um dos escritores mais experientes que conheço, disse que fez a escolha de ter uma agente literária. Dessa maneira, ele podia se dedicar integralmente à escrita, enquanto sua agente se preocupava com questões como divulgação, contato com editoras e participação em eventos.

Ao abordarmos o papel das editoras na carreira dos escritores, sejam eles independentes ou não, Ana Faria, autora de  vários livros, entre eles o romance Um ano bom, comentou que há vantagens e desvantagens, mas elas serão diferentes para cada pessoa.

Aragão então voltou a mencionar a função do agente. Ele recomendou que um escritor iniciante deve pesquisar os vários que têm sites e ler com atenção os serviços que eles prestam.

Aragão ressaltou que é importante também saber até onde deixar o agente opinar. Alguns interferem demais no texto de seus clientes. Isso pode incomodar algumas pessoas. Porém, os agentes literários possuem um leque de editoras de contato. Assim, um agente pode receber a encomenda de um livro, de acordo com um assunto "quente". Porém, ele advertiu que é sempre importante conferir a referência dos agentes entre os escritores que eles representam.

Ledinilson Moreira, autor de Portais, apontou que um escritor deve ter com clareza sobre aonde quer chegar. Afirmou que há escritores felizes por serem independentes.

Mencionei então a nossa vontade de divulgar nossos textos, alcançar nossos leitores diretamente. A angústia de ter logo um retorno pelo que escreve. Um dos caminhos seria publicar em blog, mas o resultado pode ser o contrário do esperado. Um blog precisa de constante atenção. Ele deve ser atualizado e divulgado. No fim, ele pode exigir muito trabalho, como um eterno bebê.

Aragão disse que o plágio é sempre uma possibilidade e, para não facilitar, não publica online.

Outro ponto importante que discutimos no encontro é a realidade de que o eixo Rio-SP ainda faz grande diferença. O que significa que em Minas, embora estejamos tão perto desse eixo, continuamos meio que isolados.

Por fim concluímos que o status de escritor independente é uma condição que fará parte do histórico da grande maioria daqueles que desejarem seguir carreira literária. Alguns de nós seremos sempre independentes. Isso, porém, não deve ser algo que desanime aqueles que ainda não se lançaram no ofício, ou estejam em seus primeiros passos.

Afinal, como a história do nosso país gosta de alardear, em alguns casos é "independência ou morte".

segunda-feira, maio 20, 2019

Projeto Livro-minuto - Lançamento oficial

Livro-minuto foi um termo que passei a utilizar em 2014, após aprender com o Rodrigo Teixeira uma dobradura que torna uma única folha em caderno.

Ao me deparar com esse belo truque, fiquei fascinado e decidi levar essa técnica para minhas oficinas de mediação de leitura. Nascia então o livro-minuto: a proposta de produção de um livreto que poderia ser lido em menos de um minuto.

A oficina Livro-minuto foi ofertada tanto na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte, quanto em bibliotecas de centros culturais da cidade. O princípio era ganhar simpatizantes pela proposta, de forma que mais pessoas se envolvessem no processo de produção de livros como objetos únicos, artesanais, fora da lógica de produção em série.

Minha paixão por livros sempre foi para além do texto. As obras medievais me fascinavam, com suas brochuras com iluminuras e escritos à mão. Não foi à toa que fui atraído por Jorge Luís Borges e suas ideias de livros em que imprecisões ou "erros" tipográficos os transformariam em objetos diferenciados.

Assim, quando conheci os livros artesanais, fui imediatamente cativado. Tenho em meu acervo pessoal muitos livros feitos de material reciclado, costurados à mão. E sempre que tenho oportunidade de ir a uma feira de livros independentes, saio de lá com a mochila cheia de novos tesouros.

E por isso essa minha paixão extrapolou para além do colecionismo. Passei a produzir artesanalmente minhas próprias obras através da Oficina Livro-minuto.

A proposta da atividade é refletir no papel do livro e em seu percurso como ferramenta fundamental do pensamento e da memória da humanidade. Discutimos sobre os usos do livro e sua evolução de riscos no chão, pelos desenhos rupestres, passando pela pedra talhada, pelas tábuas de argila, pelo pergaminho, até o formato convencional, conhecido como brochura, caderno ou códex. Por fim, lanço às pessoas participantes o convite de fazermos nossos livros.

Como material, além da folha de papel, uso textos em domínio público. Podem ser poemas, ditados, adivinhas, quadrinhas, trovas, sonetos. Quando o texto tem autoria identificada, não deixo de fazer menção do nome da autora ou do autor. Apresento também alguns desenhos do escritor Ricardo Azevedo para serem recortados e colados.

Todo esse material, contudo, é propositivo. Cada pessoa tem a liberdade de criar seu livro-minuto de acordo com seu impulso criativo. Assim como eu, pois aproveito para, a cada oficina, criar mais um livreto.

Tive a felicidade de participar de um sarau em que o amigo Felipe Diógenes levou suas alunas e seus alunos. Fizemos um varal e vários livretos produzidos pela garotada foram pendurados. Quem quisesse poderia pegar qualquer um e ler para o público. Foi um momento mágico.

Com o objetivo de expandir a ideia, decidi lançar oficialmente o Projeto Livro-minuto. O objetivo é fazer circular o conceito, bem como o livreto em si. Abaixo, compartilhei o vídeo do livro-minuto "JOGO". 



Posteriormente, farei propostas e postarei outros vídeos, com o objetivo de envolver ainda mais as pessoas no processo. Aguardem!

quarta-feira, abril 18, 2018

Monteiro Lobato e o Dia Nacional do Livro Infantil


Quando se fala de Literatura Infantil, muitos costumam reduzi-la a um segmento menor, como se fosse uma literatura mais "fácil". Por muito tempo, os livros para crianças e jovens eram imbuídos de uma forte carga utilitária. Era necessário que os textos fossem instrutivos e edificantes.
Há 136 anos nasceu o homem que transformaria para sempre a literatura infantil. José Bento Renato Monteiro Lobato, patrono do livro infantil em nosso país, não foi apenas o percursor da literatura infantil brasileira da atualidade, mas também fundou uma nova forma de pensar e fazer livros para jovens leitores. Em sua homenagem, o dia 18 de abril passou a ser conhecido como o Dia Nacional do Livro Infantil.
Com Reinações de Narizinho, Lobato nos apresenta uma menina que surge pra aprontar mesmo. Afinal, o sentido da palavra "reinação" era travessura, brincadeira, bagunça. E Lúcia, ou Narizinho, a protagonista desse primeiro livro de Lobato, é uma menina esperta, contestadora, inventiva. Emília, sua boneca, era apenas uma muda coadjuvante. Quando ganha voz, a boneca vai lentamente adquirindo força e peso, até se tornar o principal ícone de Lobato. 
As aventuras de Narizinho, Emília e muitas outras personagens acontecem no Sítio do Picapau Amarelo. Inicialmente, o sítio surge como um lugar comum, pacato, típico cenário do interior paulista. Porém, assim como a boneca Emília, o próprio Sítio vai ganhando contornos cada vez mais fantásticos, quase míticos, a ponto de comportar dentro de si as maravilhosas terras do mundo das Fábulas e até mesmo a Terra do Nunca.
O aspecto revolucionário de Lobato não está apenas em sua literatura infantil, mas também em sua visão empreendedora como formador de leitores. Ele decidiu levar seus livros para perto de seus leitores, aonde os livros antes nunca tinham chegado. Suas edições eram ambiciosas em números de exemplares. Assim, o que poderia ser visto como uma aposta mal feita mostrou-se uma jogada que mudou os rumos de nosso mercado editorial.
Não dá para negar as polêmicas em torno de Monteiro Lobato. Sim, há passagens ofensivas e racistas em alguns de seus livros. Não há desculpa ou justificativa. É preciso marcar, contudo, que Lobato era um homem ciente de muitas de suas contradições e não deixava de evidenciá-las. Como exemplo, temos o desabafo de Emília no final de suas memórias, quando ela admite seu preconceito em relação à Tia Nastácia, fazendo um "mea culpa". 
Sei que isso não é suficiente, nem redime Lobato. Apesar disso, é importante observar que ele, apesar de ser contundente em suas ideias, não sabia ser intransigente e sempre esteve disposto a mudá-las.
Que o Dia Nacional do Livro Infantil seja sempre um marco. Não como celebração, mas como memória. Para que as pessoas não se esqueçam dos erros e acertos de Lobato e que sigam seu exemplo na ousadia, na coragem e na inventividade.