|
Fonte: divulgação. |
Este foi o primeiro livro de C.S. Lewis com que tive contato. Lembro-me muito bem quando, aos onze anos, vaguei pelas prateleiras de uma livraria evangélica, deparando-me com um livro que de forma alguma parecia evangélico. Um casal de crianças, o menino empunhava uma espada, enquanto a menina mantinha seu olhar ao longe, como se vislumbrasse um importante destino. Atrás do casal, dominando a paisagem ao fundo, está um imponente cavaleiro negro, de armadura completa.
Já era apaixonado por literatura. E por histórias de fantasia medieval. Não preciso dizer mais nada para ficar claro que meu deslumbramento foi total. Queria aquele livro pra mim. Queria olhar através dos olhos daquelas crianças, ter minha mente invadida por seus pensamentos, perfazer os seus caminhos.
O que eu não contava, porém, era que o livro seria considerado "demoníaco". Afinal, que livro evangélico teria criaturas mitológicas como anões, faunos e centauros? Por isso, o livro me foi negado.
Alguns anos depois, visitamos uma família da mesma igreja que frequentávamos. Foi incrível descobrir que esse livro fazia parte de uma coleção e que o dono da casa tinha quase todos. Ele prontamente permitiu que eu levasse um deles emprestado e ficou surpreso que eu pedisse logo o livro seis
A Cadeira de Prata. Expliquei que sabia que
O Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa era o primeiro, embora não o fosse para mim.
A Cadeira de Prata havia sido meu primeiro livro e eu precisava o quanto antes descobrir quem eram aquelas duas crianças na capa.
Foi assim que conheci Jill e Eustáquio. Soube que ambos eram internos numa escola terrível e Jill parecia ser quem mais sofria as agruras de ter colegas maliciosos e violentos. Eustáquio havia sido um deles, mas seu comportamento no último ano tinha mudado completamente. Era intrigante mudança tão radical, de forma que a menina ficou desconfiada. Ainda assim, permitiu que Eustáquio tentasse explicar o que havia acontecido com ele.
A melhor explicação, com certeza, foi uma demonstração prática. Nárnia aconteceu na vida de Eustáquio. E ele acidentalmente fez com que o mesmo ocorresse com Jill. Tentando de alguma forma fugir de uma turma de perseguidores, os dois acabam por passar por uma porta que, ao invés de levar para a campina que havia fora do colégio, lança os dois em uma incrível aventura. Sim, em Nárnia.
A princípio, era para Eustáquio sentir-se em casa. Contudo, muita coisa mudou. Passaram-se vários anos desde a aventura narrada em A viagem do Peregrino da Alvorada, de forma que o menino está tão perdido quanto Jill. Para piorar, ele descobre que o Rei Caspian estava tão velho que poderia morrer a qualquer momento, mas seu filho, Rilian, estava desaparecido.
As duas crianças se lançam em uma jornada perigosa e angustiante em busca do paradeiro do príncipe. Um narniano viaja com os dois. Seu nome é Brejeiro, uma criatura dos pântanos, ou paulama. Os três seguem para o norte, encontram gigantes, escapam de perigos e por diversos momentos são levados a esquecer sua missão. A única forma de manter-se no caminho é não esquecer as palavras de Aslam, que Jill conheceu logo ao receber a missão. Anda assim, a cada momento, o grupo é levando de infortúnio a infortúnio para que as palavras do Leão sejam esquecidas.
Esta é uma das aventuras que mais amei durante minhas viagens pelo vasto mundo de Nárnia. Foi uma jornada de crescimento, pois este é um dos livros mais bem costurados de Lewis. Há uma trama por trás do desaparecimento do príncipe Rilian e muito do que os meninos encontram em sua jornada sugere vários desdobramentos que poderiam resultar em vários outros livros. O universo de Lewis é rico e inventivo. A magia está o tempo todo lá, em cada virada de página. E o desfecho do livro não deixa de ser comovente.
Não podemos negar que Lewis sempre buscou dar a sua literatura uma carga simbólica que expressasse sua filosofia de vida. Como um pregador cristão, este autor sempre deixou claro que sua obra tinha um compromisso também cristão. Acredito que esse compromisso tinha mais um espírito ético que moral. Seus personagens são imperfeitos, passam por crises, brigam e falham. E ainda assim o que conta não é a culpa, mas sim o poder de fazer de novo, tomar novas decisões, traçar outros caminhos. As palavras que Jill precisa lembrar podem muito bem simbolizar uma postura ética, de não se deixar levar, de ter em mente que nossa alma vale mais do que decisões impensadas visando atalhos escusos.
A Cadeira de Prata foi o livro que me despertou para o mundo mágico de C.S.Lewis. Esta afirmação parece um tanto clichê, assim como esta resenha tem mais afeto que rigor crítico. Mas não posso negar que a literatura de Lewis é uma das bases de minha formação, não apenas como leitor, mas como escritor também, assim como Monteiro Lobato, José de Alencar e Jorge Luis Borges. Estes escritores são como ancestrais destas mesmas palavras que deixei aqui registradas. Vida longa a Nárnia e vida longa a Aslam!
Ficha técnica
Edição: 1
Editora: Martins Fontes
ISBN: 8522616198
Ano: 1997
Páginas: 208
Página do livro no Skoob:
http://www.skoob.com.br/livro/1104