Estou na beira
Boiando na superfície.
Tudo o que eu vejo e sinto
Não passa de senso comum
Ainda que pareça diferente
Profundo ou chocante
Nada mais é que puro
eco.
Blog do escritor e contador de histórias Samuel Medina. Aqui você encontrará resenhas de livros, contos, crônicas, relatos de experiência e poemas. Além de informações sobre meus livros.
quarta-feira, março 25, 2015
quarta-feira, março 18, 2015
Atrito
é mais um som
a romper o sentido
a ferir outros sons
a impor outras urgências
mais um pouco do artificial
no atemporal da angústia.
O tempo não existe,
mas é uma faca a
arrancar uma veia,
perfurar um osso,
amainar a alma.
Enquanto isso,
o telefone toca
pausadamente
metodicamente
ironica...
mente.
sexta-feira, março 13, 2015
Desejo Heroico
Eu, porém, vos digo, que qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, em seu coração, já cometeu adultério com ela.
Mateus 5:28.
Mateus 5:28.
Foi de relance, quando atravessava a rua, quando viu capa de um DVD erótico. Ergueu os olhos, desconcertado. Pediu perdão por ter pecado, ainda que seu olhar tivesse durado apenas um instante.
Mesmo
nos quarteirões seguintes, a caminho do restaurante em que almoçava
todos os dias, ele ainda pensava na imagem que ficara gravada em sua
mente. Duas moças, uma morena e outra loira, ambas nuas e de costas,
exibindo toda a fartura de suas nádegas, com as marcas deixadas
pelos minúsculos biquínis definindo os contornos de suas peles
bronzeadas. Balançou cabeça com força, como se assim conseguisse
turvar essa imagem única, imperiosa.
Ergueu
os olhos mais uma vez, enquanto seus lábios moviam-se numa prece
inaudível. Não conseguia entender o que acontecia em seu interior.
Nunca havia sentido o mínimo interesse nesses materiais duvidosos.
Para ter sido atingido tão profundamente, no mínimo, já havia
pecado e não se dera conta disso. E esse pecado oculto e ignorado
seria consequência de seu afastamento espiritual. Desesperado,
passou a tarde toda pelos cantos, no escritório onde trabalhava, em
orações fervorosas que visavam purificar sua alma.
No
caminho de volta para casa, em pé dentro do ônibus lotado,
distraiu-se com o longo percurso e teve por fim alguns minutos sem
ser assaltado pelas fantasias avassaladoras, ataques do demônio. Mas
em casa, quando já tinha feito sua oração ao pé da cama, vestido
com seu pijama, ele foi novamente invadido pelas mesmas imagens,
sendo acompanhadas por um misto de expectativa, desejo e vergonha.
Afastou novamente aquele turbilhão de pensamentos.
As
imagens, contudo, não o abandonaram. Bastava passar perto da banca
de jornais que seus olhos como que instintivamente buscavam a dupla
exposta na capa do DVD. Para não alimentar a tentação, o jovem
passou a evitar a banca, passando por outro caminho para chegar ao
restaurante.
O
desejo porém crescia cada vez mais intenso, as imagens cada vez mais
vívidas. Passava noites em claro mergulhado em fantasias, sempre no
martírio de sentir-se a criatura mais suja do mundo. A culpa era
então novamente encoberta por imagens da pele morena, bronzeada, das
marcas dos biquínis fazendo um jogo de claro-escuro.
Até
que em certa noite, quando ele pensou que enlouqueceria, veio a
resolução, clara como uma revelação divina, junto com uma
expectativa infantil e por fim o sono reparador. Não havia mais
imagens para torturá-lo, somente aquele silêncio que sucede a plena
certeza. Quando a manhã chegou inexorável, a caminho para o
trabalho, não foi mais assaltado por desejos irrefreáveis. Quem o
visse até diria que seu rosto revelava uma maturidade marcante, de
alguém que alcançara a sabedoria. Foi direto para a banca de
jornais. Pediu logo o DVD erótico com simplicidade comedida, quase
sereno. Recebeu o material, pagou e atravessou a rua olhando para o
lado errado. O cobiçado DVD num instante escapou de suas mãos e um
caminhão que passava no momento selou seu destino.
quinta-feira, março 12, 2015
A juventude massacrada pelo preconceito
Ele era um garoto. Não era como eu. Nos separava a idade, a cor da pele, configuração familiar. Mesmo assim, era para ser como eu. Em minha mente, nenhuma diferença conta quando somos humanos. Ou toda a diferença conta, para mais.
Era um menino. Seu rosto machucado, coberto de ataduras, escondido pelo tubo de respiração artificial, olhos cerrados. Ignorava que morria. Enquanto isso, as mãos violentas de um discurso insano, assassino, tentavam limpar-se do sangue tão jovem. Tão meu.
Um menino. Mais uma vítima de um monstro chamado intolerância. Uma besta alimentada pelo hipócrita discurso a favor de uma família de plástico, uma família que cobre com cera as pústulas de sua luxúria. Que pinta com esmalte de "amor" suas caras sedentas por sangue. Mentes que clamam pelo escândalo, pela arena, pelo auto de fé.
Um simples garoto. Agora, ícone de minha revolta. Sua imagem ferida, inconsciente, atravessa minha garganta. Filho de um casal homoafetivo. Filho de um casal gay, filho de uma família.
Não o conheci, mas seu sofrimento reverbera em meus ouvidos, por cada vez que alguém sofre por ser ele mesmo. Por cada vez que o desrespeito se torna navalha, punho, marreta.
Estou nauseado, mortificado. Ele era apenas um menino, gente! E morreu por não ter sua família lavrada em estatuto.
quarta-feira, março 11, 2015
Sonda
extrair dela o seu sentido
fazer dela um
outro algo mais,
uma nova fronteira
e alcançar o
nada deve haver
sequer o som,
que não passe de
um efeito
defeito nosso
de existir.
segunda-feira, março 09, 2015
O Assalto - Parte II de III
Ir para O Assalto - Parte I de III
Continua...
Os portões foram abertos. De dentro surgiram rapidamente homens
montados a cavalo, que circundaram os supostos camponeses,
deixando-os isolados das carroças. O chiado das espadas sendo
desembainhadas ecoou em coro. Um homem alto, loiro, guiou seu cavalo
até parar à frente de Balgata, que segurava em sua mão direita um
pequeno saco de couro. O bandido parecia ser tão alto quanto o
capitão, e a montaria acentuava seu tamanho de forma assustadora.
Estava coberto de uma bela cota de malha e a empunhadura prateada de
sua espada refulgia. Seu rosto era longo, com as faces levemente
encovadas e os olhos pequenos e estreitos. O cabelo loiro estava
muito bem aparado e o homem cobria-se com uma capa verde-musgo
impecável. Suas botas de cano longo, com caneleiras de ferro, eram
novas. Era o segundo no comando do bando, homem de confiança de
Berak, e agora usava uma das melhores vestimentas do Conde de Arnoll.
– Deixa eu ver seu pagamento, homem! – disse o cavaleiro, tomando
o saco da mão do capitão com a ponta de sua espada. Balgata manteve
silêncio.
O homem abriu avidamente o saco de couro. Sua expressão de ganância
foi desaparecendo e dando lugar a perplexidade. Ele voltou o rosto
indignado a Balgata.
– Que merda e essa?! – Perguntou, lançando o saco de couro aos
pés de Balgata.
Dentro do saco estavam guardadas diversas pontas de metal, usadas
para as flechas dos arqueiros. Furioso, o bandido ordenou ataque.
Balgata, em contrapartida, bradou:
– Formação circular, homens! Unir escudos!
Instantaneamente, dos trapos velhos surgiram escudos que se uniram,
formando uma barreira contra as lâminas inimigas. Sobre a cabeça
daqueles que fechavam os escudos, os arqueiros ergueram-se e
iniciaram seus disparos. Pela proximidade dos inimigos, não havia
como errar. Duas supostas crianças, robustas, retiraram suas capas,
revelando suas barbas grisalhas, e lançaram suas esferas explosivas
contra alguns homens perto do portão. A explosão levou consigo três
bandidos, deixando dois seriamente feridos. Os cavalos dos demais se
assustaram com o estrondo e empinaram, relinchando. Homens caíram
para a morte sob as espadas dos atacantes. O bandido loiro também
foi derrubado, mas conseguiu se defender com habilidade, puxando o
seu escudo redondo para junto do corpo e bloqueando a espada de
Balgata. O capitão trocou golpes rápidos com seu oponente, fazendo
as lâminas emitirem sons agudos e melancólicos. Era o choro da
morte. Com habilidade, Balgata rebateu a estocada veloz e tratou de
enfiar a lâmina de sua espada no ventre do inimigo, aquele homem
alto e loiro que logo abandonou sua expressão altiva. O capitão
lançou o corpanzil do oponente contra os demais bandidos e deu um
brado de guerra, dando alguns passos para trás, de volta à relativa
segurança da formação de escudos.
O assalto começara. Agora faltava a ajuda de Seridath e seus
malignos servos.
Continua...
domingo, março 08, 2015
Caleidoscópio
Recolha em teu seio meus rostos
espalhados
espelhados
pelo prisma de teus olhos
Breves faces espectrais
ícones
soltos
em segundos que se apagam
qual velas trôpegas
e gotas arquejantes passageiras
não
quero mais que tudo
mais que quero
você
não
deixo
de querer-te
toda
inteira
e não diluída em momentos
quero você na pura essência
excelência
de mulher
sexta-feira, março 06, 2015
quarta-feira, março 04, 2015
Miragem
Covarde, sempre.
Observo as nuvens
em suas formas aleatórias
e em todas
imagino seu rosto.
E ainda assim,
você não me responde.
Sua voz não galga o vento
e os campos
nunca lembram seus cabelos.
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