Tudo
começou numa cidadezinha bem pequena, onde os frangos não
eram vendidos congelados no açougue (mas vivos!) e os ovos não
eram encontrados nas cartelas de papelão do supermercado.
Aliás, nem supermercado havia nessa cidade.
Ovos eram
vendidos em galinheiros fedorentos, onde galinhas brancas e
silenciosas comiam e botavam. Algumas também chocavam
pintinhos bem amarelos que logo viravam franguinhos e franguinhas
brancos. As franguinhas eram destinadas à produção
de ovos, fechando o interminável ciclo de exploração. Já os franguinhos tinham um destino bem pior: a
panela.
Naquele
dia o Menino havia ido ao galinheiro com o dinheiro contado para
comprar o frango do almoço. Ele foi atendido por uma mulher
esquálida, com um avental contendo um bolso dianteiro, de onde
retirava maquinalmente maços de notas e as contava e recontava. Sem olhar para o Menino, disse o
preço e esperou que o cliente escolhesse o frango que iria
levar.
Com ares
de especialista, ele olhou, examinou, ponderou. Até que bateu os olhos em uma
galinha já velha, meio capenga, que não botava mais
ovos e por isso tinha sido “rebaixada” de posto. O Menino viu
aquela galinha no meio de tantos frangos e compreendeu. Sem pensar
duas vezes, pediu para levá-la e deixou seu dinheiro com a
mulher esquálida.
Ao
chegar em casa, o Menino levou uma bronca. A Mãe tinha mandado
comprar frango novo e não galinha velha! O Menino fez que nem
era com ele. Disse que a galinha não iria para a panela. Ela
era da família agora e ponto final. Naquele dia, por causa de tanta teimosia, todos comeram ovo, frito ou cozido. A nova
integrante da família foi batizada de Camila.
O
Menino e Camila passavam muito tempo um com o outro. Às vezes,
depois do almoço, ela chegava a entrar casa adentro, sempre
silenciosa, em busca do seu salvador. O Menino ficava feliz ao ser
procurado e pegava sua amiga no colo. Passava horas conversando com
ela, que retribuía as palavras de afeto com seu habitual
silêncio, mas com um olhar tão profundo que
quase parecia carinhoso.
Seria
legal dizer que essa história nunca acabou, mas todos sabemos
que tudo acaba. Camila um dia não foi vista no quintal. O
Menino procurou sem descanso por dias a fio, sem descobrir o que fora
feito da galinha. Andou pelas ruas de terra, inquiriu vizinhos,
chorou e até pediu a Deus que lhe devolvesse a amiga. Ainda
assim, em seu peito sabia. Camila havia partido e não voltaria
mais.
Conto produzido durante
a oficina Clarice para crianças,
realizada por Simone Teodoro.
Eu tinha uma gata que se chamava Camila... Acho que é assim: a gente vai melhorando na escrita quando começa a olhar mais para os bichos e para os homens e mulheres....
ResponderExcluirÉ, Si, valeu... A escrita me ensinou muito a prestar mais atenção ao redor.
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